TJRS - DUPLICATA SIMULADA - CONDENAÇÃO AOS EMITENTES QUE NEGOCIARAM COM FACTORINGS

APELAÇÃO CRIMINAL. CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO. DUPLICATA SIMULADA. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. ANÁLISE DOS VETORES DO ARTIGO 59 DO CP PARA A FIXAÇÃO DA PENA-BASE QUE SE IMPÕE. CONFISSÃO ESPONTÂNEA. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO EM ATENÇÃO AO VERBETE 231 DA SÚMULA DO STJ. POSSIBILIDADE DE SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR UMA RESTRITIVA DE DIREITOS. CONTINUIDADE DELITIVA RECONHECIDA. EXASPERAÇÃO DA PENA DEFINITIVA EM 2/3. SENTENÇA REFORMADA.
Hipótese em que a prova constante dos autos confirma a materialidade e a autoria do crime previsto no art. 172 do CP, porquanto inquestionável que os réus emitiram duplicatas que não corresponderam à efetiva operação de compra e venda.
Pena-Base fixada no mínimo legal após a análise das circunstâncias judiciais do artigo 59 do CP.
Caso em que a atenuante da confissão não poderá ser aplicada, pois imperiosa a observância do Verbete 231 da Súmula do STJ ao caso concreto.
Com o reconhecimento da continuidade delitiva (emissão de 467 duplicatas simuladas) a pena definitiva restou fixada em 3 anos e 4 meses para cada réu, a qual foi acrescida da pena de multa nos termos do artigo 49 do CP.
Possibilitada, no presente caso, a substituição da pena restritiva de liberdade por uma pena restritiva de direitos e multa, nos termos do artigo 45, §1º, do CP.
Condenação dos réus ao pagamento, por metade, das custas processuais.
APELAÇÃO PROVIDA. POR MAIORIA. SENTENÇA REFORMADA.

APELAÇÃO CRIME
 SÉTIMA CÂMARA CRIMINAL
Nº 70041260266
 COMARCA DE DOIS IRMÃOS
MINISTERIO PUBLICO
 APELANTE
OMISSIS
 APELADO
OMISSIS
 APELADO

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Sétima Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado, por maioria, EM PROVER O RECURSO DE APELAÇÃO. VENCIDO O DESEMBARGADOR SYLVIO BAPTISTA NETO QUE O DESPROVIA.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores DES. SYLVIO BAPTISTA NETO (PRESIDENTE E REVISOR) E DES.ª NAELE OCHOA PIAZZETA.

Porto Alegre, 07 de abril de 2011.


DES. JOSÉ CONRADO KURTZ DE SOUZA,
Relator.

RELATÓRIO

DES. JOSÉ CONRADO KURTZ DE SOUZA (RELATOR)

Trata-se de denúncia ofertada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO contra OMISSIS, nascido em 06.08.1949, atualmente com 61 anos de idade (fl. 02) e OMISSIS, nascido em 30.10.1962, atualmente com 48 anos de idade (fl. 03), pela prática do crime previsto no artigo 172, caput, c/c o artigo 71, caput (467 vezes), ambos do Código Penal.

“No período compreendido entre os meses de dezembro de 2004 e junho de 2005, em horário não precisado, na sede da empresa Curtipelli Indústria e Comércio de Couros Ltda., sita na Avenida Irineu Becker, 501, nesta cidade, os denunciados OMISSIS e OMISSIS, na condição de sócios-proprietários da empresa Curtipelli Indústria e Comércio de Couros Ltda., emitiram 467 duplicatas não correspondentes à mercadoria vendida, totalizando o valor de R$ 5.031.243,04 (cinco milhões, trinta e um mil, duzentos e quarenta e três reais e quatro centavos), todas essas sacadas contra dezenas de empresas, mas que restaram negociadas via endosso, com as empresas de “factoring” On Line Sociedade de Fomento Mercantil Ltda., Valesinos Factoring Fomento Mercantil Ltda., Exicon – Exportadora, Importadora e Consultoria S/A, Círio Administradora de Valores Ltda. e Redfactor Factoring e Fomento Comercial S/A.

Segundo o apurado, ao longo do interstício temporal mencionado, os denunciados, na condição de sócios, à época, da empresa Curtipelli, todos responsáveis pela administração e gerência, e em momento precedente ao ajuizamento de Pedido de Recuperação Judicial (feito em 06/07/2005), passaram a emitir as aludidas duplicatas (cuja numeração e valores estão nos anexos I, II, III, IV e V desta), sem qualquer negócio jurídico subjacente a lhes justificar, portanto simuladas, tendo como sacadas as empresas que haviam mantido alguma negociação no passado e mesmo algumas que jamais haviam efetivado qualquer compra de mercadorias junto à empresa Curtipelli.

Concomitantemente à emissão do títulos (duplicatas), os denunciados às negociaram, via endosso, com empresas de “factoring”, quais sejam, On Line Sociedade de Fomento Mercantil Ltda., Valesinos Factoring Fomento Mercantil Ltda., Exicon – Exportadora, Importadora e Consultoria S/A, Círio Administradora de Valores Ltda. e Redfactor Factoring e Fomento Comercial S/A, em operações de aquisição de ativos, suportando essas vultoso prejuízo pecuniário, haja vista que as empresas sacadas não reconheceram a realização de negócios jurídicos correspondentes no período.

Ato contínuo, os denunciados, sob alegação de que em breve viabilizariam o reembolso das quantias envolvidas, ludibriando as empresas de “factoring”, apropriaram-se de parte dos valores recebidos, a título de complementação de “pró-labore”, lançando na escrita contábil da empresa Curtipelli sob a rubrica “Adiantamentos a Terceiros”.

A denúncia foi recebida em 24.03.2008 (fl. 2.242).

Os réus foram citados pessoalmente (fls. 2.260-2.261) e interrogados (fls. 2.266-2.275).

A defesa de OMISSIS apresentou defesa prévia arrolando testemunhas (fl. 2.277).

Durante a instrução foram inquiridas as testemunhas (fls. 2.316-2.326, 2.429-2.430, 2.441, 2.461-2.469, 2.494 e 2.505-2.507v) e ouvidas as vítimas (2.345-2.346, 2.457-2.460 e 2.478-2.478v).

As partes apresentaram memoriais (fls. 2.515-2.523 e 2.528-2534).

Sobreveio sentença (fls. 2.555-2.557), publicada em 15.09.2010 (fl. 2.559), julgando improcedente a denúncia para absolver OMISSIS e OMISSIS, forte no artigo 386, inciso II, do Código de Processo Penal.

Inconformado, apelou o Ministério Público (fls. 2.561-2.568), asseverando que, apesar da ausência de requisito formal dos documentos emitidos (ausência de assinatura do emitente), Jacó referiu, em seu interrogatório, que houve emissão de duplicata sem negócio, o que fora confirmado por OMISSIS durante o processo.

Salientou que a ausência de assinatura ou aceite por parte do sacado ocorreu em razão da inexistência de negócio entre as partes, na medida em que não houve remessa e recebimento de mercadoria. Afirmou que a materialidade e a autoria restaram amplamente comprovadas nos autos, razão pela qual requereu a condenação dos réus nos termos da denúncia.

Requereu, por fim, o provimento do recurso de apelação.

Foram apresentadas contrarrazões (fls. 2.570-2.573).

Remetidos os autos a esta Corte, a douta Procuradoria de Justiça exarou parecer pelo desprovimento do recurso (fls. 2.582-2.584).

Vieram-me conclusos os autos.

É o relatório.

VOTOS

DES. JOSÉ CONRADO KURTZ DE SOUZA (RELATOR)

Estou dando provimento ao recurso de apelação do Ministério Público.

A materialidade do crime previsto no artigo 172 do CP restou amplamente demonstrada nos documentos das fls. 495-1.042, 1.050-1.333, 1.341-1.713, 1.722-2.070 e 2.077-2.238, constituídas nas notas fiscais e duplicatas, as quais, conforme demonstrado nos autos, não tinham correspondente causa jurídica subjacente. Isto é, as duplicatas foram emitidas intencionalmente para obtenção de lucro ilícito sob o argumento de que as vendas seriam realizadas em um futuro próximo.

Do depoimento dos réus OMISSIS restou estampada a má-fé na extração dos aludidos títulos, sendo que os réus confessaram lisamente a emissão das cártulas sem o correspondente negócio jurídico subjacente.

E nem se diga que a falta de assinatura do sacador esvazia a tipicidade penal a que se refere o artigo 172 do CP.

Com efeito, a formalidade que existe no direito penal não é, data vênia, a mesma exigida na esfera cível, melhor dito, no direito cambiário.

Com isso quero dizer que ao direito penal interessa o desvalor da conduta, isto é, a evidência do dolo, ou seja, a intenção de praticar a conduta prevista abstratamente no tipo penal, se o crime, obviamente, é doloso. Ou a subsunção da conduta negligente, imperita e imprudente se o crime é culposo.

Nessa senda, é importante – e este é elemento importante de análise para identificar-se a tipicidade material do crime previsto no artigo 172, isto é, para identificar-se a relevância penal da conduta dos réus, que a falta de assinatura do eminente/sacador, ou mesmo o aceite do título, não pode ter maior exigência formal no direito penal do que tem na esfera cível.

Com efeito, é da rotina dos negócios mercantis que as duplicatas levadas a desconto bancário ou mesmo à cessão de crédito às factorings não são mais, há muitos anos, assinadas previamente (e nem posteriormente) pelo emitente/sacador dos títulos.

E isso em nada é contestado validamente, pois o que importa é a identificação do sacador/emitente do título e o correspondente negócio jurídico subjacente.

Tais títulos, sem assinaturas, enfatizo, são reputados válidos e plenamente eficazes em praticamente todas as relações comerciais que representam, mormente no âmbito de atividade da empresa da qual os réus eram sócios-proprietários.

E isso se deve à necessidade dos dias atuais de agilidade, aliás fundamento primeiro da criação e utilização sempre maior dos títulos de crédito, em especial as duplicatas.

Nos dias de hoje, tempos de reconhecimento legal e jurídico da chamada “boa fé objetiva”, o que importa, repito novamente, é a identificação do título como oriundo de tal ou qual empresa (sacador/emitente), sendo bastante à tal identificação o logotipo da empresa emitente , e assim quando mesmo não há entre o banco, ou a Factoring, e a empresa-cliente-emitente/sacadora um contrato prévio que regule o tráfego comercial (desconto bancário) ou a operação de Factoring desejada.

No caso dos autos, como é evidente e era de se esperar, não fugiu à regra a emissão dos títulos pelos réus. Como dito acima, valendo-se de prática aceita e tida por válida e eficaz no âmbito financeiro, os títulos, embora não tivessem a assinatura do sacador/emitente, no caso, dos réus, continham a certeza formal e material de sua origem atestadas no logotipo da firma dos réus e no contrato de Factoring das fls. 123-132.

Quanto à emissão propriamente dos títulos, é o próprio contador da empresa, OMISSIS, à fl. 2.494 dos autos, que confirma que muitas, e enfatizo: muitas!, duplicatas foram emitidas entre os anos de 2003 a 2006 com base em encomendas e negócios futuros que supostamente seriam realizados. Salientou o Sr. OMISSIS que “muitas duplicatas também foram emitidas sem que estivessem embasadas em negócios realizados pela empresa, ou seja, eram duplicatas ‘frias’. Essas duplicatas eram endossadas e descontadas junto a bancos e factorings”.

Neste ponto, o réu OMISSIS, ao ser indagado sobre o ocorrido assim relatou (fls. 2.266-2.272):

“(...) J: A sua empresa teve solicitado a recuperação judicial e posteriormente foi convertido em falência?

R: Exatamente.

J: No curso deste processo, surgiram inúmeras duplicatas que teriam sido apontadas como fraudulentas, O que o senhor poderia falar sobre esse fato?

R: Eu não vejo no sentido de fraudulentas, porque todas as empresas que negociavam conosco, que ganhavam juros, se propuseram a trabalhar dessa maneira, Não só naquele ano, mas também como em anos anteriores.

J: Mas de que maneira?

R: Era faturado sobre pedidos, sobre possíveis vendas e notas de compras. Como nós tínhamos credibilidade com as empresas de factoring, pediam se nós tínhamos algum faturamento para os próximos 15(quinze) dias. Eu tinha com Calçados Malu, com Maide, Virth, Kuntzler ou qualquer fábrica. Perguntavam quanto venderia. Tendo mais ou menos as amostras feitas, as companhias de exportação iriam mandar os pedidos dentro de 10 (dez0, 15 (quinze) dias. Tem 28 (vinte e oito) dias de prazo, mais os 28 (vinte e oito) dias que demoram para fazer, tu vais fazer em 60 (sessenta) dias. Eles me autorizavam a emitir os títulos e eu faturava. Se embarcasse eu fazia as correções de prazo, se foi embarcado um dia antes ou um dia depois dos prazos estipulados, Se não, nós reembolsávamos os títulos. Acontecia casos, como foi o que ocorreu depois de todo esse problema, pela própria recuperação judicial, que as coisas não andavam mais. O mercado caiu, a máquina roda parou de andar, Já se fazia isso há bastante tempo com eles. As Factorings mesmo se propuseram. Pelas normas de Factorings ou de bancos, tu sempre vai apresentar as cópias das notas fiscais e os canhotos de entrega da mercadoria. Eles nunca me pediram isso, sabiam da credibilidade que nós tínhamos, porque era uma empresa antiga, uma empresa que tinha uma gama de clientes boa. Então eles achavam que nunca iria acontecer isso, Por consequência, nós também achávamos que nunca iria cair o mercado dessa maneira. Então essa situação que aconteceu. Durante esse período em que houve a recuperação judicial, (...), eu não posso reconhecer quais os títulos que foram emitidos. Eu não posso reconhecer porque algumas coisas foram liquidadas nesse período da recuperação judicial da empresa. Porque a Online, a Redfactor, (...) e outras tantas, foram fazendo operações com a Curtipelli, com a recuperação judicial e reembolsando alguns títulos.
(...)

MP: O senhor concorda que nesse caso houve emissão de duplicata sem negócio?

R: Não existia negócio, existia perspectiva.”

Com efeito, afora a inquestionável proveniência dos títulos, restou plenamente comprovado pela confissão dos réus, como já afirmado alhures, a sua emissão ilegal.

Permissa vênia, volto a enfatizar a evidente tipicidade material do artigo 172 do CP demonstrada através da própria eficácia que os títulos demonstram ter, tanto assim que os réus lograram apropriar-se da quantia de cinco milhões de reais em prejuízo de várias vítimas, afirmação que é corroborada pelo testemunho do síndico da Massa Falida Curtipelli, OMISSIS, às fls. 2.441.

Ainda a reforçar a tipicidade material, não se pode descuidar de observar-se a plena validade e eficácia do contrato de fomento mercantil firmado entre a empresa de propriedade dos réus, emitente dos títulos, e as empresas lesadas (fls. 123-132).

Assim sendo, peço vênia à transcrição das alegações finais do Digno representante do Ministério Público signatário do recurso que ora se está a dar provimento (fls. 2.515-2.523), verbis:

“A materialidade delitiva resta consubstanciada nos documentos que integram os 'anexos I a V, bem 'como 'na prova testemunhal coletada.

A autoria foi demonstrada pela prova oral produzida nos autos.

Em primeiro lugar, é preciso ressaltar que o delito de duplicata simulada, tipificado no artigo 172 do Código Penal Brasileiro, caracteriza-se pela emissão de duplicata sem suporte causal lícito, colocada em circulação. Consiste na extração de título que não corresponda a uma venda ou prestação de serviço efetivamente realizada, ou ainda, quando há simulação referente à qualidade ou quantidade dos produtos comercializados.

Considerando-se o elemento subjetivo, configura-se o delito quando há o dolo, a vontade de expedir duplicata simulada ("fria") que não corresponda à venda ou prestação de serviço, tendo o agente plena ciência desse fato.

No caso em tela, levando em conta os elementos objetivo e subjetivo caracterizadores do tipo penal, vê-se que restou clara nos autos a prática do ilícito por parte dos réus.

OMISSIS, quando interrogado, fls. 2266/2273, afirmou não ler praticado os delitos narrados na denúncia; alegou, em suma, que as empresas com as quais mantinha negócios - venda de camurça - aceitavam faturamento sobre pedidos futuros (possíveis vendas). Corno tinha credibilidade com as empresas de factoring, negociava as duplicatas.

Disse que' tinha autorização para emitir títulos. Admitiu que Marciano cuidava da parte financeira, mas que esse fazia simplesmente o que era determinado, sem poderes de gerência. Igualmente referiu que, acaso o os pedidos não se realizavam, e já existente título acerca daquela negociação resgatava- o.

OMISSIS, interrogado nas fls. 2273/2275, ratificou a versão apresentada por OMISSIS, ou seja, de que havia emissão de títulos em vista de ordens de compra (faturamento antecipado).

Entretanto, a versão apresentada pelos réus não veio ratificada pelos testemunhos coligidos' aos autos, como se demonstrará.

OMISSIS, fls. 2316/2317, disse nada saber sobre os tais pedidos antecipados e emissão de títulos, testemunha inclusive arrolada pela defesa.

OMISSIS, fls. 2318/2320, é sócia da empresa Calçados Wirth Ltda. e responsável pelo setor financeiro. Disse que as empresas Wirth e Curtipelli mantinham negócios.

Todavia, surgiram duplicatas sem a correspondente compra ou entrada de mercadoria. Aduziu que o controle é muito rigoroso, ou seja, não entra mercadoria sem nota. Afirmou que foram devolvidas as duplicatas sem o respectivo negócio subjacente. Na mesma balada as declarações de OMISSIS, fls. 2321/2326, contador da empresa Calçados Henrich Ltda., ratificando que apareceram duplicatas em cobrança sem a respectiva negociação. Acrescentou que a empresa Curtipelli não foi autorizada emissão, de duplicata para entrega futura de mercadoria, desmentindo os réus.

OMISSIS e OMISSIS foram ouvidos nas fls. 2345/2346. Eram esses responsáveis pela empresa de factoring, Exicon. Relataram que mantinham negócios com a empresa Curtipelli (desconto de duplicatas). Contudo, depois de uma crise, a Curtipelli passou a emitir "duplicas frias", arcando a Exicon com um prejuízo de mais de R$.1.200.000,00 '(um milhão e duzentos mil reais).

OMISSIS, fls. 2429/2430, foi perito contábil na falência da empresa Curtipelli, Confirmou em seu depoimento que a empresa, antes da recuperação judicial, - estava emitindo duplicatas sem o respectivo negócio subjacente.

OMISSIS, fl. 2441, administrador judicial nomeado na recuperação judicial e mais tarde na falência, disse ter constatado irregularidades no que se refere às duplicatas. Acrescentou que as empresas sacadas eram todas conhecidas (idôneas), o que levava os bancos e instituições financeiras (factoring) a negociar os títulos. Depois se verificou que tais duplicatas não representavam qualquer negociação.

OMISSIS, fls. 2457/2460, é um  dos sócios da empresa de factoring Vale Sinos Factory. Disse que negociava com a Curtipelli (troca de títulos), o que perdurou por vários anos. Mas antes de a empresa enfrentar problemas financeiros, passou a receber cartas de clientes relatando que eram faturadas mercadorias não recebidas e emitidos títulos sem a correspondente negociação (títulos frios). Afirmou que quem mais negociava era OMISSIS e, às vezes, o próprio OMISSIS.

OMISSIS, fls. 2461/2463., confirmou que foram emitidas duplicatas frias contra sua empresa e que partiram da Curtipelli.

OMISSIS, fl. 2478, representante da empresa On Line Sociedade de Fomento Mercantil Ltda., ratificou que mantinha negociações, com a "Curtipelli. Mas a partir de um determinado momento - a partir do ano de 2005 - não ocorriam mais pagamentos, ou seja, as empresas sacadas diziam que os" títulos não tinham procedência.

Interessante é o depoimento de OMISSIS, fl. 2494, então contador da empresa Curtipelli. "Disse que efetivamente emitia duplicatas com base em encomendas e negócios futuros. Tais (duplicatas frias)' eram endossadas e negociadas junto as factoring. Mesmo alertando Jacó e Marciano da irregularidade, esses persistiram na prática; o que era feito em razão do endividamento da empresa. Revelou, ainda, que OMISSIS e OMISSIS costumavam fazer" retiradas de dinheiro da empresa a título de prolabore, mas os registros contábeis eram feitos como se fossem adiantamentos a terceiros.

Como se percebe, diante dos depoimentos supracitados e da prova documental acostada ao feito, restou evidenciado que não havia, realmente, negócio entabulado entre a empresa da ré e as empresas sacadas que justificassem a emissão dos títulos.

Ademais, ficou evidenciado, primeiro, que ambos os réus tinham conhecimento da ilegalidade praticada e "não como sugeriu Jacó, ou seja, que Marciano apenas cumpria ordens. Segundo, que as tais emissões de duplicatas por conta de negócio futuro podem até ter acontecido, mas em época passada e com o conhecimento das empresas sacadas. Enfim, referentemente às empresas Calçados Henrich Ltda. e Calçados Wirth Ltda., isso não acontecia.

Finalmente, é fácil se deduzir o "modus operandi" dos réus. A empresa Curtipelli, pelo seu longo histórico e mesmo tradição aos produtos que comercializava, tinha estreita relação com diversas empresas do ramo calçadista - essas de renome na região. Igualmente por conta dessa relação de confiança, ao ensejo dos negócios entabulados, a Curtipelli negociava com instituições financeiras os títulos emitidos em face daquelas vendas (desconto de títulos, que consistia em adiantamentos de numerários mediante endosso dos títulos e consequente deságio). Tudo ia bem porque as empresas sacadas eram idôneas (com nome limpo na praça, como se costuma dizer) e pagavam os títulos emitidos pela Curtipelli mas que foram endossados às instituições financeiras.

Diante dessa captação de confiança havida entre a Curtipelli, seus clientes e instituições financeiras, aproveitaram-se os réus, pois frente a um quadro econômico-financeiro nada otimista da primeira, passou a emitir títulos sem a existência de qualquer negócio originário. Ou seja, simulava uma venda, emitia a duplicata e a negociava com os bancos ou empresas de factoring. Quando da cobrança a empresa sacada era surpreendida, porquanto nenhuma compra havia sido efetivada junto a Curtipelli.

Observe-se, que não há nos autos fartos documentos que comprovam não ter havido, na época dos fatos, negócio entre a empresa dos réus e as empresas sacadas, o que prova a simulação.

Nesse aspecto, pertinente é a transcrição de arestos que apontam o entendimento remansoso dos Tribunais no sentido de que há a configuração do crime de simulação de duplicata se a transação não foi efetivamente realizada:

A duplicata emitida com base em negócio mercantil: posteriormente desfeito, não caracteriza o delito de emissão de duplicata simulada prevista no artigo 172 do Código Penal, pois, para a configuração 'deste crime doloso, é necessária a consciência do agente de que o título emitido não corresponde a uma operação de venda de mercadoria ou a um serviço prestado. (TACRSP - RT 750/641) - (grifou-se).

DUPLICATA SIMULADA - Venda inexistente - Art. 172 do CP. Alcance. A Lei 8.137/90 não expungiu do cenário jurídico, como fato glosado no campo penal, a emissão de fatura, duplicata ou nota que não corresponda a uma venda ou prestação de serviços efetivamente realizados, conduta ,que se mostra tão punível quanto aquelas que encerrem simulação relativamente à qualidade ou quantidade dos produtos comercializados. (STF - HC 78.538-4/RS - r T. - Re{ Min. Marco Aurélio - DJU 18.08.1995) (RJ 217/127) - (grifou-se).

DUPLICATA SIMULADA - VENDA INEXISTENTE - ARTIGO 172 DO CÓDIGO PENAL - ALCANCE - A Lei nº 8.137, de 28 de dezembro de 1990, não expungiu do cenário jurídico, como fato glosado no campo penal, a emissão de fatura, duplicata ou nota que não corresponda a uma venda ou prestação de serviços efetivamente realizados, conduta que se mostra tão punível quanto aquelas que encerrem simulação relativamente a qualidade ou quantidade dos produtos comercializados. (STF - HC 72.538 - RS – 2ª T. -  ReI. Min. Marco Aurélio –DJU 18.08.1995) - (grifou-se).

Nesse sentido tem entendido a jurisprudência do Tribunal de Justiça Gaúcho:

EMENTA: DUPLICATA SIMULADA. [...] CARACTERIZAÇÃO DO DELITO. Configura o crime do art. 172 do CP a conduta do agente que emite e coloca' em circulação duplicata não correspondente a efetiva prestação. de serviço, sendo irrelevante para a consumação do delito que o referido título cambial tenha se destinado ao pagamento parcial de dívida preexistente com o endossatário, ou que o réu tivesse a intenção de honrá-lo no seu vencimento. Ademais, o delito. do artigo 172 do CP é crime formal, consumando-se com a expedição do título, com ou sem o seu aceite, pois aquele que assina,a duplicata tem o dever de verificar previamente se sua emissão corresponde a um negócio efetivo e real. pois. do contrário. estará assumindo o risco do resultado lesivo.•A confissão do réu, ainda que de forma a exculpar-se, justificando as razões de ter praticado o delito, deve ser considerada para efeito de atenuação da pena. RECURSO, DEFENSIVO PARCIALMENTE PROVIDA. UNÂNIME. (Apelação Crime, N° 70009621301, Sexta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ivan Leomar Bruxel, Julgado em 09/08/2007). (grifo nosso)

Desta forma, vislumbra-se a má-fé dos réus, pois quando da emissão dos títulos, estes não correspondiam a negócio entre as partes, o que serve de amparo à caracterização do tipo penal em análise que, como já referido, exige a ciência do agente de estar emitindo duplicata sem o devido suporte casual, o que, no caso em tela, é indiscutível”.

Dito isso, restou incontroverso nos autos que os apelados, na condição de sócios-proprietários da empresa Curtipelli Indústria e Comércio de Couros Ltda, emitiram 467 duplicatas sem que a elas correspondesse qualquer contrato de compra e venda mercantil ou prestação de serviços com as empresas tidas como sacadas.

Posteriormente, procederam à imediata circulação das cártulas cedendo os “imaginários” créditos às empresas de factoring Online Sociedade de Fomento Mercantil Ltda, Valesinos Factoring Fomento Mercantil Ltda, Exicon-Exportadora, Importadora e Consultoria S/A, Círio Administradora de Valores Ltda e Redfactor Factoring e Fomento Comercial Ltda, resultando em vultosos prejuízos.

Do todo narrado, importante destacar-se que o fato de as empresas de Factoring terem permanecido negociando as duplicatas com os réus, com base, repito, tão-somente na boa fé, isto é, na confiança na produção da empresa dos réus, o fato é que o bem juridicamente tutelado neste feito não se traduz unicamente no prejuízo ao patrimônio privado das empresas de Factoring lesadas, o que levaria o feito à discussão na esfera cível, mas na tutela da boa fé, em nível penal, nas relações comerciais.

Deste modo, o crime cometido, como já frisado, não causa lesão tão-somente ao patrimônio das factorings que receberam as duplicadas pela via do endosso/cessão e adiantaram o pagamento ao sacador/réus, tampouco às empresas sacadas que sofreram protestos sem ao menos terem efetivado qualquer compra de mercadoria com os réus, mas ao setor econômico em geral.

E isto é plenamente verificado no fato de que os réus, segundo afirmação do contador da empresa Curtipelli, começaram a adotar o sistema das duplicatas simuladas em função do endividamento da empresa, bem ainda para realizarem retiradas de dinheiro a título de pró-labore, cujos registros contábeis eram feitos como se fossem “adiantamentos a terceiros” (fl. 2.494).

Veja-se na fl. 30 dos presentes autos que consta na declaração patrimonial da Curtipelli (ano 2005) que os réus retiraram da empresa, sob a rubrica “adiantamento a terceiros”, a quantia de R$ 1.540.240,60, fato que corrobora o depoimento do contador OMISSIS.

Não bastasse isto, importa referir que o perito contábil, Orlando OMISSIS, nomeado judicialmente para lançar parecer nos autos da ação de recuperação judicial da empresa Curtipelli, notadamente no que refere à exatidão das informações dos balanços e balancetes contábeis, foi categórico ao assim assegurar: (fls. 44-52)

“(...)7.10. Ao final de cada exercício a contabilidade em muitos casos efetuava as devoluções e estornava as vendas, colocando em risco a idoneidade de empresas que no passado foram clientes e agora estavam sendo usadas sem saber, comprometendo inclusive os arquivos das repartições públicas enviados mensalmente, ou até mesmo os apontamentos de protestos que recaiam sobre a emitente que saldava a dívida sem o conhecimento da empresa que estava sendo usada;

9. Registre-se que existiu o intuito de fraude contra terceiros, pois a administração retirou da empresa valores exorbitantes, devem estes valores à empresa, como adiante apontaremos, criou simulações de créditos inexistentes por absoluta incompetência e de forma propositada.

10. O desequilíbrio e a perda de economicidade da empresa foi preparado durante anos. A posição patrimonial registrada e apresentada como a existente, devem ser motivos de investigações imprescindíveis para perícias futuras.

11. Legitimando o nascimento das contas, não só o registro singelo, investigando qual a razão de sua existência e abertura dos lançamentos constatamos a conta ADIANTAMENTO A TERCEIROS, como créditos, compondo o ativo circulante da empresa na monta de R$=1.587.782,21=( Hum milhão, quinhentos e oitenta e sete mil, setecentos e oitenta e dois reais e vinte e um centavos), valores estes simplesmente transferidos aos sócios da sociedade na seguinte proporção: OMISSIS (R$=546.099,94=), OMISSIS (R$=358.542,22=) E OMISSIS (R$=683.140,05=), valores retirados por cheque da empresa a estes, sem contrato, sem retenções fiscais e previdenciárias, pois não eram despesas de pró-labores, mas transferências diretas da empresa aos sócios efetuadas por estes mesmos.

12. Constatou-se um aumento no Ativo Imobilizado, especialmente na conta Imóveis, sendo que a única matrícula de propriedade da empresa é a de nº 1.183, do Registro de Imóveis da Comarca de Dois Irmãos, onde constam as penhoras do INSS e Estado do Rio Grande do Sul, com saldo aproximado de R$=1.000.000,00= ao INSS e R$=400.000,00= ao Estado do Rio Grande do Sul. Os lançamentos de aumento no ativo Permanente segundo o Sr. Contador foi efetuado sem qualquer laudo de reavaliação ou aquisições, mas simplesmente utilizou estas contas para fazer a contrapartida das duplicatas frias lançadas no passivo (crédito).
(...)

14. Ainda que de forma inicial, não restam dúvidas que existiu fraude e não erro. O erro é uma ação involuntária, sem o intuito de causar dano, enquanto que a fraude é uma ação premeditada para lesar alguém, que não restam dúvidas, no caso concreto, existiram ou existem. As fraudes se operam com desvios de dinheiro, recebimentos de créditos sem origens, despesas fictícias, pois as despesas financeiras lançadas eram de duplicatas sem origem, adulteração de documentos e falsificação destes. Não restam dúvidas que as fraudes ocorridas foram por quem tinha a autoridade, ou seja, por quem decide ou comanda o capital circulante da empresa, como: dinheiro, estoques e créditos a receber”. (grifei)

Giza-se que o citado laudo teve a colaboração do contador da empresa na época dos fatos, Sr. Silvio Ernani Davi, consoante afirmação da fl. 47.

Dito isto, conclui-se que a prática de emissão e endosso(cessão) das duplicatas sem a venda de mercadorias, ainda que no início das negociatas os sócios tivessem agido de boa-fé, tanto que modernizaram o estabelecimento comercial com a compra de equipamentos novos, renovando, inclusive o prédio de madeira por outro de alvenaria (depoimento da testemunha OMISSIS – fls. 2.505-2.507verso), quando a empresa estava passando por dificuldades financeiras, posteriormente, ou seja, com o passar dos anos, os réus não mais honraram os compromissos financeiros, locupletando-se de valores que não constam dos balancetes fiscais.

Portanto, a via de ingresso ilícito de dinheiro estava dando certo e foi pelos réus dolosamente mantida, somente tendo cessado quando não mais honraram com os compromissos financeiros assumidos com as vítimas.

Assim sendo, inconteste a materialidade e a autoria da prática delitiva em questão, impositiva a condenação dos réus OMISSIS e OMISSIS como incursos nas sanções do artigo 172  caput, c/c artigo 71, caput (467 vezes), ambos do Código Penal.

Ultrapassado este ponto, passo, pois, à dosimetria da pena:

Réu – OMISSIS:

Ao analisar as circunstâncias do artigo 59 do CP, verifico que o a culpabilidade do réu Jacó não ultrapassa do grau ordinário. O réu não apresenta antecedentes criminais (primário), segundo dá conta a certidão das fls. 157-158 e 2.255; a conduta social e a personalidade do agente não restaram esclarecidas; os motivos são os normais à espécie, ou seja, obtenção de lucro; as circunstâncias não apresentam qualquer conotação especial; as consequências são as habituais ao crime de duplicata simulada, isto é, o prejuízo patrimonial das vítimas e econômico-financeiro para o Estado. As vítimas, no caso, em nada contribuíram para a prática do ilícito, pois o fato de realizarem negócios com o acusado, em absoluto, significa contribuição à prática ilícita, porque o faziam de forma legítima, no exercício de suas atividades comerciais.

Deste modo, fixo a PENA-BASE em 02 anos de reclusão.

Na Segunda Fase, embora verificada a presença da atenuante da confissão espontânea, inserta no artigo 65, inciso III, alínea “d”, fica afastada a sua aplicação em virtude do que preceitua o Verbete 231 da Súmula do STJ. Fixo, pois, a PENA PROVISÓRIA em 02 anos de reclusão.

Na Terceira Fase, ausente causas modificadoras fixo a PENA DEFINITIVA em 2 anos de reclusão, condenando o réu, ainda, à sanção pecuniária de 10 dias-multa, à razão de 1/30 do salário mínimo vigente à época do fato.

Verificada a continuidade delitiva (emissão de 467 duplicatas simuladas), nos termos do artigo 71 do CP, exaspero a pena em 2/3, o que resulta no apenamento definitivo de 3 anos e 4 meses de reclusão.

O regime inicial de cumprimento do apenamento será o aberto, em atenção ao preceituado no artigo 33, §2º, alínea “c”, do CP.

Presentes os requisitos do artigo 44, §2º, do CP, SUBSTITUO a pena privativa de liberdade por uma restritiva de direitos – prestação de serviço à comunidade pelo mesmo período, em entidade pública a ser designada pelo juízo da execução criminal, e multa no valor de dois salários mínimos vigente à época do efetivo pagamento, nos termos do artigo 45, §1º, do CP, a ser paga à entidade pública ou privada com destinação social, a ser escolhida, também, pelo juízo da execução.

Condeno o réu OMISSIS ao pagamento de metade das custas processuais.

Réu – OMISSIS:

Ao analisar as circunstâncias do artigo 59 do CP, verifico que o a culpabilidade do réu OMISSIS não ultrapassa do grau ordinário. O réu não apresenta antecedentes criminais (primário), segundo dá conta a certidão das fls. 159-160 e 2.257; a conduta social e a personalidade do agente não restaram esclarecidas; os motivos são os normais à espécie, ou seja, obtenção de lucro; as circunstâncias não apresentam qualquer conotação especial; as consequências são as habituais ao crime de duplicata simulada, isto é, o prejuízo patrimonial das vítimas e econômico-financeiro para o Estado. As vítimas, no caso, em nada contribuíram para a prática do ilícito, pois o fato de realizarem negócios com o acusado, em absoluto, significa contribuição à prática ilícita, porque o faziam de forma legítima, no exercício de suas atividades comerciais.

Deste modo, fixo a PENA-BASE em 02 anos de reclusão.

Na Segunda Fase, embora verificada a presença da atenuante da confissão espontânea, inserta no artigo 65, inciso III, alínea “d”, fica afastada a sua aplicação em virtude do que preceitua o Verbete 231 da Súmula do STJ. Fixo, pois, a PENA PROVISÓRIA em 02 anos de reclusão.

Na Terceira Fase, ausente causas modificadoras fixo a PENA DEFINITIVA em 2 anos de reclusão, condenando o réu, ainda, à sanção pecuniária de 10 dias-multa, à razão de 1/30 do salário mínimo vigente à época do fato.

Verificada a continuidade delitiva (emissão de 467 duplicatas simuladas), nos termos do artigo 71 do CP, exaspero a pena em 2/3, o que resulta no apenamento definitivo de 3 anos e 4 meses de reclusão.

O regime inicial de cumprimento do apenamento será o aberto, em atenção ao preceituado no artigo 33, §2º, alínea “c”, do CP.

Presentes os requisitos do artigo 44, §2º, do CP, SUBSTITUO a pena privativa de liberdade por uma restritiva de direitos – prestação de serviço à comunidade pelo mesmo período, em entidade pública a ser designada pelo juízo da execução criminal, e multa no valor de dois salários mínimos vigente à época do efetivo pagamento, nos termos do artigo 45, §1º, do CP, a ser paga à entidade pública ou privada com destinação social, a ser escolhida, também, pelo juízo da execução.

Condeno o réu OMISSIS ao pagamento de metade das custas processuais.

Dito, isto, estou dando provimento à apelação, nos termos da fundamentação.

É o voto.


DES. SYLVIO BAPTISTA NETO (PRESIDENTE E REVISOR)

Divergindo do ilustre Relator, vou negar provimento ao apelo, fazendo-o com os bons e jurídicos argumentos da ilustre Julgadora, Dra. Angela Roberta Paps Dumerque, que decidiu da seguinte forma:

“Primeiramente, cumprir fazer algumas ponderações acerca do título de crédito em apreço.

A Lei nº 5.474/68 conceitua a duplicata como um título formal, que circula por meio de endosso, constituindo um saque fundado sobre um crédito decorrente de uma compra e venda mercantil ou prestação de serviços.

Tal formalidade exige que o título preencha todos os requisitos previstos no artigo 2º, §1º da Lei da Duplicata, quais sejam: “§ 1º A duplicata conterá: I - a denominação "duplicata", a data de sua emissão e o número de ordem; II - o número da fatura; III - a data certa do vencimento ou a declaração de ser a duplicata à vista; IV - o nome e domicílio do vendedor e do comprador; V - a importância a pagar, em algarismos e por extenso; VI - a praça de pagamento; VII - a cláusula à ordem; VIII - a declaração do reconhecimento de sua exatidão e da obrigação de pagá-la, a ser assinada pelo comprador, como aceite, cambial; IX - a assinatura do emitente”.

Analisando o caderno probatório, vejo que razão assiste à defesa quando sustenta que não pode prosperar a presente ação penal, eis que inexiste comprovação material do delito. Explico.

As duplicatas objeto da presente ação penal não apresentam todos os requisitos a lhe conferir a natureza de título de crédito, pois estão destituídas de assinatura do emitente. Ou seja, os documentos que encontram-se juntados nos autos não constituem títulos de crédito, pois não constam neles a assinatura do sacador, conforme exigido pelo inciso IX do § 1º do art. 2º da Lei nº 5.474/68.

Desta forma, cumpre afastar a possibilidade de ser julgada procedente a presente denúncia, eis que os documentos juntados não podem ser considerados duplicatas e, por consequência, não existe materialidade delitiva para configurar o crime previsto no artigo 172 do Código Penal.

Nesse sentido:

“Inexiste o crime do artigo 172 quando não há assinatura do emitente do título” (STF, RT 778/526), in Código Penal Comentado, Celso Delmanto et alli, Edit. Renovar, 6ª ed., pág. 416.

Ainda:

“... Não foram carreadas aos autos as duplicatas que, em tese, teriam sido emitidas e postas em circulação pelo acusado. Assim, não há como se confrontar a assinatura do emitente, elemento fundamental à criação do título. O crime previsto no artigo 172 do Código Penal, que cuida da duplicata simulada, é infração que deixa vestígios materiais, motivo pelo qual não prescinde da apresentação do título, que constitui elemento indispensável à formação do corpo de delito. Apelo defensivo provido. Prejudicada a preliminar de nulidade da sentença”. (Apelação 70018030304, Sexta Câmara Criminal do TJRS, Relator: Nereu José Giacomolli...).
Inexistindo, pois, prova acerca da materialidade do crime de duplicata simulada, a absolvição dos acusados é medida que se impõe.”

Assim, nos termos supra, nego provimento ao apelo.

DES.ª NAELE OCHOA PIAZZETA - De acordo com o(a) Relator(a).

DES. SYLVIO BAPTISTA NETO - Presidente - Apelação Crime nº 70041260266, Comarca de Dois Irmãos: "POR MAIORIA. PROVERAM O RECURSO DE APELAÇÃO. VENCIDO O DESEMBARGADOR SYLVIO BAPTISTA NETO QUE O DESPROVIA."

Julgador(a) de 1º Grau: ANGELA ROBERTA PAPS DUMERQUE