TJMS - DUPLICATA - INOPONIBILIDADE A PORTADOR DE BOA-FÉ

E M E N T A  –   APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO MONITÓRIA – DUPLICATA – CONTRATO DE FOMENTO MERCANTIL – FACTORING – CESSÃO CIVIL DE CRÉDITO – NOTIFICAÇÃO DO DEVEDOR OBRIGATÓRIA – ARTIGO 209 DO CC/02 – REALIZAÇÃO – PORTADOR TERCEIRO DE BOA-FÉ – TÍTULO LITERAL E AUTÔNOMO – INOPONIBILIDADE DE QUALQUER EXCEÇÃO PESSOAL QUE POSSUA CONTRA O ANTIGO CREDOR – PREQUESTIONAMENTO EXPRESSO – DESNECESSIDADE – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

Processo: 2011.004987-9    Julgamento: 10/03/2011 Órgao Julgador: 5ª Turma Cível Classe: Apelação Cível - Execução 

10.3.2011

Quinta Turma Cível

Apelação Cível - Execução - N. 2011.004987-9/0000-00 - Campo Grande.

Relator                    -   Exmo. Sr. Des. Júlio Roberto Siqueira Cardoso.

Apelante                 -   Agro Amazônia Produtos Agropecuários Ltda.

Advogado               -   Décio José Tessaro.

Apelado                  -   Digital Factoring Fomento Comercial Ltda.

Advogado               -   José Antônio Veiga.

Intdo                     -   Sementes Nacional Ltda.

Advogado               -   Marcelino Duarte.


E M E N T A           –   APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO MONITÓRIA – DUPLICATA – CONTRATO DE FOMENTO MERCANTIL – FACTORING – CESSÃO CIVIL DE CRÉDITO – NOTIFICAÇÃO DO DEVEDOR OBRIGATÓRIA – ARTIGO 209 DO CC/02 – REALIZAÇÃO – PORTADOR TERCEIRO DE BOA-FÉ – TÍTULO LITERAL E AUTÔNOMO – INOPONIBILIDADE DE QUALQUER EXCEÇÃO PESSOAL QUE POSSUA CONTRA O ANTIGO CREDOR – PREQUESTIONAMENTO EXPRESSO – DESNECESSIDADE – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.


A  C  Ó  R  D  à O

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os juízes da Quinta Turma Cível do Tribunal de Justiça, na conformidade da ata de julgamentos e das notas taquigráficas, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator.

Campo Grande, 10 de março de 2011.

Des. Júlio Roberto Siqueira Cardoso – Relator
 

RELATÓRIO

O Sr. Des. Júlio Roberto Siqueira Cardoso

Agro Amazônia Produtos Agropecuários Ltda interpôs recurso de apelação contra decisão proferida pela juíza da 10ª Vara Cível desta capital que, nos autos da ação monitória, julgou parcialmente procedente o pleito formulado na inicial, nos seguintes termos:

“Ante o exposto, julgo parcialmente procedente o pedido formulado na inicial para o fim de constituir de pleno direito o título executivo judicial embasado na duplicata que instrui a inicial, no valor de R$ 37.700,00 (trinta e sete mil e setecentos reais), na forma do art. 1.102c, do Código de Processo Civil, aplicando-se correção monetária pelo IGPM/FGV, a partir da data em que deveria ter sido paga (15/11/2006), e juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês a partir da citação.”

Alega a apelante que a duplicata n° 1460-B, emitida em 14.08.2006, com vencimento previsto para o dia 15.11.2006, restou descontada em factoring desta capital, contudo seu valor deixou de ser devido em razão da mercadoria não ter sido entregue na sua totalidade, sendo que a vendedora (empresa Sementes Nacional Ltda) comprometeu-se a resgatá-la.

Afirma que a duplicata foi antecedida da respectiva compra e venda de mercadoria que não foi entregue à compradora, o que retira a liquidez, certeza e exigibilidade do título.

Aduz que a duplicata não atende as formalidades previstas no artigo 2º da Lei n° 5474/68.

Prequestionou toda a matéria abordada no recurso.

Pugna, ao final, pelo conhecimento e provimento do recurso, com a consequente inversão dos ônus sucumbenciais.

Contrarrazões apresentadas às fls. 137/143.

VOTO

O Sr. Des. Júlio Roberto Siqueira Cardoso (Relator)

Trata-se de recurso de apelação interposto por Agro Amazônia Produtos Agropecuários Ltda contra decisão proferida pela juíza da 10ª Vara Cível desta capital que, nos autos da ação monitória, julgou parcialmente procedente o pleito formulado na inicial, com o objetivo de constituir de pleno direito o título executivo judicial baseado na duplicata de n° 001460-B, no valor de R$ 37.700,00 (trinta e sete mil reais).

O recurso não comporta provimento.

Trata-se os autos de ação monitoria ajuizada pela autora-apelada para cobrança da duplicata de n° 001460-B, emitida em 14.08.2006, com vencimento em 15.11.2006, a qual foi objeto de contrato de “factoring” com a empresa Sementes Nacional Ltda, possuindo como sacada a apelante.

Para amparar seu direito, tendo em vista que ao receber referida duplicata por meio do Contrato de Fomento Mercantil - Factoring (fls. 16), adquiriu os direitos oriundos das cártulas mediante cessão civil de crédito, a recorrida colacionou aos autos notificação de compra e venda de créditos – confirmação de compra realizada e entrega de mercadorias – fls. 14/15, com o objetivo de atender o disposto no artigo 290 do Estatuto Civil de 2002, que assim preceitua:

“Art. 290. A cessão do crédito não tem eficácia em relação ao devedor, senão quando a este notificada; mas por notificado se tem o devedor que, em escrito público ou particular, se declarou ciente da cessão feita.”

Referida notificação, que vale destacar, possuía todos os requisitos de validade, eis que indicava o número do título, o sacador (emitente), o seu valor e a data de seu vencimento, além da finalidade do documento, foi encaminhada e recebida pela apelante, consoante se denota pela assinatura posta na fls. 14/15 dos autos.

Agora, almeja a apelante se escusar de honrar com tal obrigação, sob o argumento de que o montante contido na duplicata de n° 1460-B deixou de ser devido em razão da mercadoria não ter sido entregue pela empresa Sementes Nacional Ltda na sua totalidade, não estando, portanto, revestida de liquidez, certeza e exigibilidade.

Ora, é certo que em se tratando de duplicata, que como é sabido é título de crédito abstrato (“não-causal”), uma vez circulado ou entregue a terceiro de boa-fé, evidencia-se como título de crédito literal e autônomo.

Desta forma, tem-se que, verificada a independência da duplicata, o fato da recorrente sustentar a ausência de entrega de mercadorias (alegação esta, vale destacar, que não foi corroborada nos autos), não obsta o direito de recebimento da credora-apelada do crédito especificado no título, uma vez que esta, de boa-fé, o recebeu através da cessão de crédito.

Nesse mesmo sentido é a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que, mutatis mutandi, se adequa ao caso em questão:

“O cheque é título literal e abstrato. Exceções pessoais, ligadas ao negócio subjacente, somente podem ser opostas a quem tenha participado do negócio. Endossado o cheque a terceiro de boa fé, questões ligada a causa debendi originária não podem ser manifestadas contra o terceiro legítimo portador do título. Lei 7357/85, arts. 13 e 25. Recurso Especial conhecido e provido para o restabelecimento da sentença de improcedência dos embargos”

(STJ; REsp n° 2814/MT - Recurso Especial n° 1990/0003607-0; Ministro Athos Carneiro; T4 – Quarta Turma; Dje 06/08/1990).

Desta forma, tendo em vista que a obrigação assumida entre a apelante e a empresa Sementes Nacional Ltda é independente desta, objeto da presente lide, que se realizou em sua plenitude e autonomia, não pode a devedora se escusar do cumprimento da obrigação antes assumida, eis que inoponível qualquer exceção pessoal que possua contra qualquer obrigado anterior em desfavor da apelada, como pretende a recorrente.

Assim, em que pese as fundamentações de fato e de direito expostas nas razões recursais pela apelante, a decisão proferida em instância singela deve ser mantida na íntegra, eis que não logrou êxito em comprovar qualquer fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito da apelada – CPC, art. 333, II[1], ônus este que lhe incumbia.

Do prequestionamento

Por fim, quanto ao prequestionamento realizado pela recorrente, tendo sido todas as questões levantadas devida e satisfatoriamente apreciadas, resta dispensável qualquer manifestação expressa acerca do dispositivo legal invocado.

Nesse sentido, o posicionamento deste Sodalício, in verbis:

APELAÇÃO CÍVEL - CONTRATO BANCÁRIO - AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO - (...) - PREQUESTIONAMENTO EXPRESSO - DESNECESSIDADE - RECURSO IMPROVIDO.

(TJMS; Apelação Cível n° 2009.006947-2; Rel. Des. Luiz Tadeu Barbosa Silva; Órgão Julgador: 5ª Turma Cível; julgamento: 02.04.2009).

Dessa maneira, improvejo o pedido de manifestação expressa de cada um dos dispositivos veiculados.

Da conclusão

Destarte, diante de todo o exposto, conheço do recurso, contudo nego-lhe provimento, para manter intacta a decisão prolatada pela autoridade judiciária de primeiro grau.

DECISÃO

Como consta na ata, a decisão foi a seguinte:

POR UNANIMIDADE, NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR.

Presidência do Exmo. Sr. Des. Luiz Tadeu Barbosa Silva.

Relator, o Exmo. Sr. Des. Júlio Roberto Siqueira Cardoso.

Tomaram parte no julgamento os Exmos. Srs. Desembargadores Júlio Roberto Siqueira Cardoso, Sideni Soncini Pimentel e Luiz Tadeu Barbosa Silva.

Campo Grande, 10 de março de 2011.


ac
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[1] " Art. 333. O ônus da prova incumbe:

   I - ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito;

  II - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor."