Economia

Menor oferta e incertezas tendem a postergar melhora do microcrédito

 
São Paulo - A menor oferta por bancos públicos, as altas taxas de juros e a incerteza sobre o futuro do País tendem a ser obstáculos e podem postergar a retomada mais forte do microcrédito. O alto desemprego, porém, deve dar um fôlego à linha a partir de agosto.

Os últimos dados do Banco Central apontam que a concessão na linha de microcrédito recuou 16,3% em abril deste ano frente igual período de 2016, de R$ 812 milhões para R$ 679 milhões).

No acumulado dos quatro primeiros meses, a queda foi de 10,22% (de R$ 3,119 bilhões para R$ 2,800 bilhões), na mesma comparação.

Da mesma forma, o saldo da carteira do sistema financeiro direcionada para a linha também recuou 11,3% (de R$ 5,155 bilhões para R$ 4,569 bilhões), em abril.

De acordo com o professor de economia da Saint Paul Escola de Negócios, Alan Ghani, o ambiente de crise econômica e a instabilidade política trouxe maior aversão ao risco por parte dos bancos e mais cautela para os microempreendedores.

"Isso tudo provoca uma redução de capital. Ainda que antes tudo indicava uma retomada lenta da economia, a atual crise política trouxe um retrocesso muito grande que, evidentemente, acaba afetando o crédito de forma geral", avalia o especialista.

Além disso, o menor apetite dos bancos públicos - maiores players do mercado em relação a microcrédito - também tem dado o baque nas concessões da linha.

"É difícil dizer se os bancos públicos chegaram ao limite de operação, mas eles têm pequenas quedas na carteira. Isso sem contar as demais operações menores que existem por parte das financeiras, que chegam a cobrar 6% de taxa ao mês. Isso tudo também esfria o mercado", explica o superintendente de microcrédito do Santander, Tiago Abate.

Ainda segundo dados do BC as taxas médias de juros para a linha demonstraram alta de 0,18 ponto percentual em abril deste ano contra igual mês de 2016 (de 29,39% ao ano para 29,57% ao ano - total equivalente a cerca de 2,18% ao mês).

"Os aspectos conjunturais atrapalham o microcrédito e, somado ao salto da inadimplência nos últimos anos, o cenário para investimento ou tomada de recurso fica bem mais complicado", pondera o professor de finanças do Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais do Rio de Janeiro (Ibmec/RJ), Ricardo Macedo.

Segundo informações do BC, em abril do ano passado a inadimplência do microcrédito atingiu o maior nível da série histórica, com 7,67%. Em igual mês deste ano, porém, os calotes reduziram 2,03 pontos percentuais, a 5,64%.

"Mesmo assim, o ambiente incerto deve atrapalhar a linha de crédito, ainda mais com o microempreendedor sem saber se haverá demanda o suficiente para pagar pelo investimento tomado. E isso deve acontecer pelo menos até que a economia retome seu curso de melhora", completa Macedo, do Ibmec/RJ.

Busca por renda

Da outra ponta, os especialistas entrevistados pelo DCI reforçam que o crescente número de desempregados tende a impulsionar a busca por esse empréstimo a partir do segundo semestre de 2017.

De acordo com os últimos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), o nível de desocupação chegou a 14 milhões, o maior volume para o trimestre terminado em abril da série histórica.

"Existem dois movimentos. O primeiro realmente é o fraco volume de vendas e a consequente queda na demanda por parte do microempreendedor", explica o professor da Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras (Fipecafi), Silvio Paixão.

"O segundo, porém, e é o que tende a acontecer com mais intensidade, é a busca pela linha exatamente pelas taxas mais em conta e pela necessidade em renda por parte da população", acrescenta.

Para Abate, do Santander, a média de empréstimos de R$ 2 mil ainda não foi o suficiente para os demais bancos privados "abraçarem a causa" do microcrédito, mas as perspectivas são bastante positivas.

"A perda de emprego desperta o empreendedorismo. É essa a visão que deve continuar acelerando o setor. No Santander, por exemplo, a média de crescimento é de 5% ao mês e a perspectiva é dobrar a equipe até 2018 para suprir essa demanda", afirma.

"As pessoas já vinham pegando o crédito com mais precaução e a perspectiva é que isso se intensifique, principalmente a partir de agosto, quando o microempreendedor começa a se posicionar mais fortemente para o final do ano. As pessoas vão ter que se reinventar", conclui Paixão.

Isabela Bolzani

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