Economia

CVM tenta tornar mercado de dívida mais líquido

A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) quer tornar o mercado de dívida corporativa no Brasil maior e mais líquido. O primeiro passo nessa direção foi a elaboração de um estudo para diagnosticar medidas a serem tomadas.

O levantamento, divulgado ontem, elencou algumas propostas, que incluem incentivos para a emissão de papéis por pequenas e médias empresas e a flexibilização de regras para dupla listagem, permitindo a emissão em moeda estrangeira no Brasil.

Esse documento vai servir de subsídio para parte da ampla reforma do regime de ofertas públicas que deve ser iniciada pelo regulador ainda este ano. A autarquia também aponta medidas fora de seu escopo que podem ser tomadas junto com outros participantes do mercado, como a instituição de um comitê permanente de especialistas em dívida privada, previsto para ser criado em 2019.

O estudo analisou a experiência internacional no incentivo ao financiamento privado de empresas pequenas e médias. A exemplo dos chamados mini-bonds italianos, a Assessoria de Análise Econômica e Gestão de Riscos (ASA), área da CVM responsável pelo estudo, propõe a criação de mecanismos de garantia para a emissão de títulos por companhias de menor porte. Esse ponto foge do escopo do regulador e o levantamento recomenda que o tema entre na pauta legislativa da CVM.

"No Brasil, o caminho tradicional é o crédito bancário e gostaríamos de ver essas empresas atuando no mercado de capitais. Em períodos adversos, o mercado de dívida pode ser estabilizador do crédito e o dano à economia passa a ser mais limitado", diz o chefe da ASA, Bruno Luna.

Segundo ele, o que se observa no mundo é que o governo ou instituições atuam prestando garantias, como um crédito subordinado ou colateral da operação. "Isso de um lado permite dar financiamentos a mais pequenas e médias empresas e por outro reduz o risco", defende.

No caso da Itália, foi criado um fundo federal para dar as garantias, o que não precisa ser feito necessariamente da mesma forma no Brasil. Outra medida do mercado italiano sugerida pela ASA é a configuração da figura do assessor financeiro voltado a essas emissões. O país europeu passou a oferecer benefícios tributários, algo que o regulador brasileiro não considera para o mercado local. "Entendemos que a questão da garantia, pelo que observamos na Itália, foi tão fundamental ou mais que o próprio benefício tributário", afirma.

Para a CVM, os papéis italianos representam um exemplo "relativamente exitoso". Já o mini-bond alemão, na visão da autarquia, demonstrou que o processo de desenvolvimento do mercado pode ser comprometido quando certos aspectos são ignorados durante o estágio inicial. O regulador cita a ausência de fixação de covenants e de colaterais para os títulos emitidos, o que resultou em baixa participação de investidores profissionais nas ofertas primárias.

A dívida privada possui papel preponderante no mercado de capitais brasileiro em termos de captação de recursos. Seis instrumentos de renda fixa - debêntures, notas promissórias, certificados de recebíveis imobiliários e do agronegócio (CRI e CRA), letras financeiras e fundos de investimento de direitos creditórios (FIDCs) - foram responsáveis por 84% dos R$ 765 bilhões levantados nos últimos cinco anos. As ações (R$ 94 bilhões) responderam por 10% do total.

As debêntures são os instrumentos mais relevantes do ponto de vista de volume financeiro e representaram 63% do montante captado entre 2011 e 2018, chegando a R$ 704,6 bilhões. O níveis de liquidez ainda são reduzidos no mercado secundário, mas houve algum incremento no último biênio. A ASA analisou a evolução do giro mensal dos papéis, considerando a razão entre o volume total negociado e o estoque em circulação ao fim de cada mês. Os valores oscilavam em torno de 1,5% do estoque de debêntures em 2015 e 2016, enquanto flutuavam ao redor de 2,0% em 2017 até setembro de 2018.

Segundo Luna, resolvendo de modo geral algumas questões, a liquidez desse mercado seria impactada positivamente, atraindo a atenção de investidores como seguradoras ou fundos de pensão.

A questão da dupla listagem, importada do mercado israelense, pode ajudar nisso. A medida seria motivado pelo fato de que grandes empresas já emitem muito mais lá fora do que aqui. "Acreditamos que isso poderia ter efeito positivo no sentido de começar uma padronização no mercado para níveis internacionais", diz o chefe da ASA, citando a possibilidade de descontos regulatórios para emissores que seguissem estes padrões.

O levantamento aponta a necessidade de racionalizar o processo de análise e registro de ofertas, com simplificação de documentos, permitir a recompra, facilitar a reabertura e avaliar a introdução de mecanismo de substituição de séries pelas emissoras. Propõe, ainda, ampliar os limites de destinatários e subscritores em ofertas com esforços restritos, entre outros pontos.

Fonte: Juliana Schincariol , do Valor

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