Economia

Banco digital tem ao menos 5 anos de expansão pela frente

Pouco mais de seis meses após atingir a marca de 1 milhão de clientes, o Banco Inter já dobrou o número de correntistas e, mantido o ritmo de crescimento, terminará 2019 com quase 3,5 milhões.

Criado em 1994 como financeira Intermedium, com o propósito de realizar operações de crédito imobiliário - afinal, a família Menin também controla a construtora MRV -, o banco mudou de nome em 2017 e apostou fortemente no modelo digital para crescer no varejo.

A expansão vem em um ritmo acelerado. O banco divulgou ontem sua prévia operacional do primeiro trimestre e o número de clientes aumentou 261% na comparação anual. Mesmo com o crescimento, a qualidade do serviço se mantém elevada, a julgar pela avaliação dos clientes. O NPS ("net promotor score"), que mede o engajamento do cliente, atingiu 76 pontos, o maior do setor financeiro.

Em entrevista ao Valor, o diretor-presidente do Inter, João Vitor Menin, de 37 anos, diz que há espaço para os bancos digitais continuarem crescendo fortemente nos próximos cinco anos. "Quase 110 milhões de pessoas têm conta corrente e outros 40 milhões não têm. Temos pelos menos uns cinco anos pela frente sem precisar de consolidação nenhuma no setor de bancos digitais, com alguns participantes, como a gente, crescendo muito rápido", disse.

O Inter, segundo Menin, deve promover uma grande reformulação no seu aplicativo, segregando a parte bancária e criando um marketplace de "lifestyle", em que o cliente poderá acessar um ampla gama de produtos e serviços, não só do setor financeiro. Desde sua oferta pública inicial de ações (IPO, na sigla em inglês), em maio do ano passado, as ações do Banco Inter acumulam alta de 200%. Confirma abaixo os principais trechos da entrevista.

Valor: Olhando os números do Inter, a primeira pergunta que vem à cabeça é: dá para continuar crescendo nesse ritmo?

João Vitor Menin: Nós temos um conceito de "marketing" que é construir um mercado para o seu produto. O nosso marketing foi muito feliz porque nosso produto tem três elementos combinados: experiência totalmente digital, gratuidade e oferta completa de produtos. Nossa proposta de valor é muito forte. As pessoas usam, gostam e recomendam. Então nós temos 2 milhões de propagadores do produto. Isso nos leva a crer que a gente pode sim almejar continuar tendo esse ritmo de desempenho. Se pegarmos o ritmo de crescimento do primeiro trimestre e replicar para o resto do ano, podemos terminar 2019 com quase 3,5 milhões de clientes. O mercado endereçável no Brasil é gigantesco. Quase 110 milhões de pessoas têm conta corrente e outros 40 milhões não têm. Temos pelos menos uns cinco anos pela frente sem precisar de consolidação nenhuma no setor, com alguns participantes, como a gente, crescendo muito rápido.

Valor: Como fica a questão da concorrência, com novos entrantes no mercado de banco digital?

Menin: Nós somos o único banco digital com uma oferta completa de serviços. Itaú tem app, o Bradesco tem o Next, e existem fintechs que atuam em alguns segmentos, como o Nubank. Existem bancos com tecnologia embarcada, mas não são digitais. É o "mindset", a cultura de tudo pelo cliente, de transparência, gratuidade, oferta completa de serviços. Aos poucos estamos nos transformando em mais do que uma empresa de serviços financeiros, e sim um marketplace de serviços. Em junho, julho vamos lançar uma nova versão do nosso app, na qual vamos separar a parte de banco e criar uma área de marketplace chamada "lifestyle", onde teremos serviços de moradia, mobilidade, educação, viagem, alimentação, entretenimento.

"Estamos nos transformando em, mais do que uma empresa de serviços financeiros, um marketplace de serviços"

Valor: Mas como fazer para monetizar esses serviços?

Menin: O cara já estando com a conta aberta e o dinheiro lá, se ele quiser comprar um seguro, uma recarga de celular, pegar um empréstimo imobiliário, fazer uma operação de câmbio, por exemplo, é muito fácil, rápido. Nesses produtos a gente monetiza. E tem a questão do canal de distribuição, que as empresas nos pagam para usar. Quando o cliente faz uma recarga de celular, a operadora nos paga uma taxa. Quando o cliente faz uma compra com o cartão, a adquirente paga uma taxa para o banco. E temos a plataforma de investimentos, o homebroker. É uma plataforma totalmente aberta, com produtos de terceiros, CDBs de outros bancos.

Valor: Vocês tem capital para continuar crescendo? Há plano de uma oferta subsequente de ações ("follow on") no curto prazo?

Menin: Nosso índice de Basileia hoje está em mais ou menos 28%, então a gente tem espaço para continuar crescendo. Fizemos o IPO no ano passado, que foi muito bom. Tem de ter consistência. Fazer um "follow-on" por fazer não faz sentido. A questão do "follow-on" não está em nossas prioridades.

Valor: O retorno sobre o patrimônio (ROE) do Inter ainda está bem abaixo dos grandes bancos privados. Há previsão de melhora?

Menin: No ano passado a gente ficou com um ROE perto de 10,5%. Nesse momento de crescimento muito rápido, acho que há um mérito muito grande nesse número. Temos muito investimento, demora um pouco para monetizar. O objetivo não é chegar no nível do Itaú. É possível, se quisesse poderia ter um ROE de até 30% este ano, só que estaríamos destruindo valor para o acionista. Eu pararia de crescer, de investir. Esse equilíbrio de crescimento e retorno é muito discutido no nosso conselho. Temos de ser sábios para não errar a mão nem para um lado nem para o outro. Acho que nos próximos dois anos, é possível chegar entre 15% e 20% de ROE, sem forçar a mão.

Valor: Há planos de alguma operação de fusão ou aquisição? E expansão internacional?

Menin: Não nos passa pela cabeça comprar "clientes", adquirir algum rival para aumentar nossa base de clientes. Mas temos um canal de distribuição muito forte, poderíamos trazer uma empresa que tem uma operação boa, know how num segmento de seguros ou cartão, por exemplo. Temos algumas conversas em andamento, mas são operações pequenas. Expansão internacional não faz sentido agora, mas acreditamos que nosso modelo é replicável. Hoje nosso foco é no Brasil, mas temos sim vontade de exportar esse modelo.

Valor: Como é o investimento do Inter em tecnologia?

Menin: Nosso porcentual de investimento sobre a receita é menor do que o dos grandes bancos. A questão é que a gente emprega o dinheiro melhor. Os grandes bancos têm centros de processamento de dados gigantescos, que custaram dezenas de bilhões de reais. Nós somos os primeiros a estar 100% na nuvem AWS, da Amazon. É muito mais barato e mais escalável. Eu sou engenheiro de formação, por isso, essa obsessão por processos mais eficientes.

Valor: Como fica a questão da segurança cibernética? No ano passado vocês tiveram um problema da vazamento de dados.

Menin: Não foi um vazamento de dados, foi um funcionário terceirizado que furtou dados e nos chantageou. Uma parcela muito pequena dos clientes foi afetada e ninguém teve um centavo de prejuízo. A questão da segurança cibernética é um problema global, para bancos, companhia aérea, o que for. O volume de dados transacionado é cada vez maior e a abertura do usuário também. Obviamente que estamos trabalhando para não ter mais esse tipo de problema. A nuvem é mais segura que outras opções.

Fonte: Álvaro Campos, do Valor

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