Economia

BC conta com ‘fintechs’ para o microcrédito

Dois bancos digitais - o Original e o Inter - manifestaram ao Banco Central a intenção de criar plataformas eletrônicas de microcrédito, tão logo seja aprovada no Congresso Nacional a medida provisória (MP) que muda as regras do setor e o governo baixe a nova regulamentação para esse tipo de operação.

O surgimento de novas plataformas eletrônicas, ligadas a bancos digitais e outras fintechs, é a aposta do Banco Central para desempoçar os cerca de R$ 342 milhões do direcionamento obrigatório ao microcrédito que não vêm sendo aplicados pelo sistema financeiro tradicional.

Pelas regras atuais, os bancos devem destinar a operações de microcrédito 2% dos recursos captados sob a forma de depósitos à vista, o que atualmente dá lastro a uma carteira ativa de R$ 6,124 bilhões. O governo anunciou que vai aumentar em 50% o direcionamento de recursos, para 3% dos depósitos à vista.

A parcela não utilizada do direcionamento está concentrada em alguns grandes bancos. Até agora, com a exceção da Caixa Econômica Federal, eles não indicaram um interesse especial ao Banco Central em operar nesse nicho de mercado. O microcrédito tem um tíquete médio pequeno e exige anos de investimento para a carteira atingir a escala mínima com que operam as grandes instituições financeiras.

Apesar do baixo interesse no negócio, esses grandes bancos relutam em transferir recursos não aplicados para os seus concorrentes diretos, já que as operações de microcrédito têm grande potencial para fidelizar clientes. A esperança do BC é que estejam mais abertos a firmar parcerias com os bancos digitais ou com as fintechs, nos moldes que já fazem no crédito consignado, por exemplo.

Algumas mudanças em gestação nas regras do microcrédito vão permitir que bancos possam cumprir as exigibilidades por meio da compra de carteiras geradas por outros bancos ou por fintechs. Além disso, o governo deverá regulamentar a MP nº 509, que amplia o leque de punições aos bancos que não cumprem as exigibilidades, permitindo que o BC cobre juros sobre as deficiências na aplicação. Pelas regras atuais, os bancos estão apenas sujeitos a recolhimento ao BC dos recursos não aplicados, sem receber remuneração.

“Com as mudanças que o governo e o Congresso estão fazendo, queremos criar a nossa plataforma de microcrédito”, confirma o vice-presidente de tecnologia, inovação e operações do Banco Original, Raul Moreira. Ele participou das consultas feitas pelo Banco Central e Ministério da Fazenda para aperfeiçoar as regras. “Acredito que, com o tempo, outros bancos digitais e fintechs vão se interessar pelo negócio.” Procurado pela reportagem, o Banco Inter não quis se pronunciar.

Atualmente há basicamente duas operações de grande porte no microcrédito. O Santander mantém a Prospera, que faz uso intensivo de tecnologia e teoricamente poderia multiplicar rapidamente os volumes de microcrédito, se tiver acesso a mais recursos. Outro grande é o Banco do Nordeste (BNB), com o Crediamigo, que usa sobretudo os agentes de crédito.

Para estimular o surgimento de novas plataformas, a regulamentação também vai flexibilizar as regras para torná-las mais amistosas às novas tecnologias de contratação de operações. Não será necessário, por exemplo, a visita de agentes de crédito para fechar o primeiro negócio. “As novas tecnologias, como geolocalização por satélite e vídeos por celular, permitem atestar com uma boa dose de segurança que o empreendimento realmente existe e está em operação”, diz Moreira.

O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, vem repetindo que o primeiro boleto de uma operação de microcrédito custa apenas R$ 1,20 quando é feito por uma plataforma digital, enquanto que no sistema manual custa pelo menos R$ 30,00. Um agente de crédito no sistema digital atende a 1200 clientes, quatro vezes mais do que no manual.

A expectativa do BC é que a carteira do microcrédito aumente para R$ 15 bilhões. Campos tem repetido que a taxa de retorno no capital de 30% ao ano deve atrair novos participantes para o microcrédito.

No governo do PT, a Caixa e o Banco do Brasil fizeram programas de microcrédito por meio de seus canais eletrônicos, mas foram abandonados devido ao aumento da inadimplência. Naquela época, o dinheiro foi dirigido ao consumo, sem vínculo necessariamente com o microcrédito produtivo orientado. “Basicamente jogaram dinheiro do helicóptero”, afirma uma fonte da área econômica. Além disso, hoje a tecnologia é mais avançada para a avaliação de risco de crédito, o que contribui para que a taxa de inadimplência do microcrédito (2,86%) seja menor do que o crédito como um todo para pessoas físicas (3,5%).

https://www.sinfacsp.com.br/noticia/bc-conta-com-fintechs-para-o-microcredito-valor-economico