Gestão de processos judiciais no setor de factoring

No factoring trabalhamos essencialmente com finanças. Nas “prateleiras” das empresas do setor, o principal produto a ser comercializado é o dinheiro. O dia-a-dia dos empresários de factoring é analisar as propostas de operações que chegam a toda hora.

São diversas as etapas que uma operação passa até ser aprovada ou rejeitada. No momento anterior a liberação da operação, foi efetuada a análise de crédito do cedente, do sacado, conferência de limites, confirmação dos títulos, análise de viabilidade econômica da operação, dentre outras etapas.

O que pretendo neste artigo é justamente trazer ao debate a importância de se analisar um processo judicial da mesma maneira como se o empresário estivesse decidindo se é viável e segura uma operação de factoring.

É de extrema importância que os litígios sejam tratados de forma inteligente. Devemos tratar uma demanda judicial não sói do ponto de vista jurídico, mas também do ponto de vista empresarial, de negócio.

Penso que o empresário deva ser um parceiro de seu advogado na busca pelos seus direitos, decidindo junto, não simplesmente entregando a demanda em suas mãos.

No processo decisório judicial deve ser levado em conta a “teoria econômica do litígio”, que nada mais é do que a análise da viabilidade econômica do processo, do grau de probabilidade de sucesso e insucesso na demanda, bem como, a estimação do ganho ou perda patrimonial que a factoring terá como resultado deste conflito.

A estratégia a ser utilizada deve ser compartilhada entre empresário e advogado. A participação de ambos no processo decisório tende a tornar os resultados melhores.

Num litígio judicial como parte ativa, o empresário de factoring, com o auxílio de seu advogado, deverá levar em consideração:

• O custo financeiro da demanda (custas judiciais);

• A morosidade da justiça;

• A eventual sucumbência no caso de cobranças infrutíferas;

• A tendência jurisprudencial dos tribunais regionais e federais;

• A possibilidade de contra-ataque (revisionais);

• A expectativa de valor eventualmente recebido;

• O gasto de tempo em administrar as ações judiciais (custo do envolvimento do empresário);

• A qualidade do título (confirmação, garantias, notificação, etc.)

• O momento certo da finalização das negociações pré-judiciais (acordos, renegociação, etc.);

• O famoso e não tão eventual “ganha, mas não leva”.

•. Enfim, as circunstâncias favoráveis e desfavoráveis do caso concreto.

Nos litígios em que a factoring é o sujeito passivo, a melhor forma de estratégia é a prevenção, pois normalmente estes advém de órgãos de classe (CRA, CRE) e, principalmente, da falta de cuidados com protestos de títulos inadimplidos e revisionais de contra-ataque.

A demanda judicial existindo, deve o empresário considerar o momento processual que se encontra, se o processo está tramitando no primeiro grau, com ou sem sentença, ou já está em grau de recurso. Utilizar a “inteligência processual” é também, saber a melhor hora de encerrar um processo através de um acordo.

Outra solução interessante para ser levada em consideração é a utilização de meios indiretos de cobrança judicial, como por exemplo, a “notícia crime”, no caso de duplicatas simuladas e outros casos do gênero.

Cabe ressaltar que existem casos que o valor financeiro a ser buscado deverá ficar em segundo plano. Certas situações, principalmente em casos de golpe, o empresário deverá pensar na “instituição” factoring, buscando as vias legais para responsabilizar criminalmente quem se utiliza de meios ilícitos para trapacear no mercado, mesmo que financeiramente possa não ser vantajoso. O agir desta forma certamente inibe futuros golpes do tipo e beneficia todo o setor.

Quanto à análise do risco, é sabido que mensurar possibilidades jurídicas não é tarefa fácil, porém, há que ser feito. Um bom planejamento para a condução de uma ação judicial deve dividir o risco em pelo menos três possibilidades:

• Risco remoto: até 25% de chances de perder;

• Risco possível: de 26 a 75% de chances de perder;

• Risco provável: acima de 76% de chances de perder.

Um exemplo de risco provável de perda é a situação em que houve o protesto realmente indevido de um título, e o empresário sabe quando isto realmente ocorreu, advindo dará a reparação pelo abalo de crédito e/ou dano moral.

No risco remoto de perda, temos o exemplo da execução judicial de uma duplicata com confirmação documentada, notificação de compra, recibo de entrega das mercadorias válido e contra uma empresa economicamente saudável.

Vejam que as possibilidades acima não devem ter como foco só a parte judicial, mas, também, da obtenção do sucesso efetivo de receber ou não, quando sujeito ativo e vencedor, ou de pagar ou não, quando sujeito passivo e perdedor. A eficiência judicial de nada vale se não estiver acompanhada da eficácia em termos financeiros.

Ao analisarmos o caso específico do setor, podemos notar que a possibilidade da factoring pagar algum insucesso judicial é bastante provável, visto que, como dito antes, nas suas “prateleiras” existe o dinheiro que será facilmente bloqueado para o pagamento. Já no caso de seus adversários judiciais a realidade é completamente outra, sabemos todos. Qual a chance de o demandado possuir dinheiro ou bens suficientes para pagar a dívida?

Por isso, sou um defensor da prática preventiva e da inteligência na condução dos processos inevitáveis. Os exemplos de sucesso completo em demandas judiciais, com efetivo recebimento de valores pelas factorings, infelizmente, não são muito comuns.

A palavra “estratégia” deve acompanhar o empresário de factoring em todas as suas ações, preventivas ou não. A desinformação, a negligência, o assessoramento deficiente e a ganância são os causadores de muitos prejuízos totalmente evitáveis.

Sempre haverá dúvidas do tipo:

• Vale a pena um enfrentamento judicial?

• Deixar passar ou enfrentar?

• Flexibilidade ou inflexibilidade?

• Até quando negociar extrajudicialmente?

• Quando encerrar um processo?

• Até quanto é vantagem acordar no processo?

• Qual a autonomia que devo dar ao meu advogado nas negociações?

Todas essas questões são relevantes e devem ser analisadas caso a caso.

Sabemos que existem empresários mais propensos ao risco, e isso não é pecado, penso eu. A propensão ao risco pode levar a uma maior lucratividade na maioria dos casos, porém, deve sempre vir acompanhada de maiores cuidados, maior qualificação dos profissionais envolvidos no negócio, dentre outros.

Por tudo isso, é interessante e produtivo que cada vez mais a gestão dos processos judiciais seja tratada de forma estratégica e holística, associando sempre os conhecimentos do empresário com os do advogado, pois perder pouco quando se perderia muito, ou ganhar menos quando não se ganharia nada, certamente é uma vantagem que não pode ser desprezada no mundo dos negócios.

Em suma, inteligência na condução do risco jurídico e na gestão dos processos judiciais é trazer o conhecimento do advogado para a ação preventiva dentro da factoring e associar o conhecimento do empresário de factoring ao advogado na gestão dos processos judiciais. Essa é a minha opinião.

Se quiser comentar o presente artigo: desbesel@terra.com.br
 

Ernani Desbesel

Ernani Desbesel

Especialista em Negócios de Compra de Recebíveis
MBA em Gestão Estratégica de Factoring
Advogado há 26 anos com especialidade em negócios das Empresas de Compra de Recebíveis
Palestrante em 11 cursos sobre o Setor de Compra de Recebíveis
Ex-empresário do Setor de Fomento Mercantil
Consultor de Empresas de Factoring, Securitização e FIDC
Auditor de Riscos da ISO 31000:2009 (Gestão de Riscos)