TJSP - DUPLICATA SIMULADA - CONDENAÇÃO DO RESPONSÁVEL PELA EMISSÃO

Duplicata simulada: Prescrição Inocorrência Réu que contava com 69 anos de idade na data da sentença condenatória Art. 115 do Código Penal Não aplicação, ainda que o acusado tenha completado 70 anos depois da sentença Preliminar rejeitada. Duplicada simulada: Acusado que sustenta não ter sido o responsável direto pela emissão, porque estava internado em hospital Reconhecimento da assinatura das cártulas Conhecimento inequívoco de que foram sacadas de forma irregular Autoria comprovada Condenação mantida. Duplicada simulada: Crime formal que se consuma com a colocação do título no mercado Ausência de prejuízo à vítima Irrelevância Condenação mantida; Duplicata simulada: Confissão Ausência de reconhecimento espontâneo e completo do delito Atenuante não caracterizada Aplicação, ademais, da Súmula nº 231, do Superior Tribunal de Justiça Recurso improvido.

PODER JUDICIÁRIO
 
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
 
Apelação nº 0386073-53.2010.8.26.0000 
 
Apelante: Omissis 
 
Apelado: Ministério Público do Estado de São Paulo 
 
Corréu: Omissis 

Voto nº 2492
 
Registro: 2013.0000391984 
 
ACÓRDÃO
 
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 0386073-53.2010.8.26.0000, da Comarca de Ribeirão Preto, em que é apelante Omissis é apelado MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO. ACORDAM, em 4ª Câmara Criminal Extraordinária do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Rejeitaram a preliminar e negaram provimento ao recurso para manutenção da r. sentença proferida pelos seus próprios fundamentos. V.U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. 
 
O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores EUVALDO CHAIB (Presidente) e SALLES ABREU. São Paulo, 27 de junho de 2013. 
 
Alexandre Almeida
RELATOR
 
Duplicata simulada: Prescrição Inocorrência Réu que contava com 69 anos de idade na data da sentença condenatória Art. 115 do Código Penal Não aplicação, ainda que o acusado tenha completado 70 anos depois da sentença Preliminar rejeitada. 

Duplicada simulada: Acusado que sustenta não ter sido o responsável direto pela emissão, porque estava internado em hospital Reconhecimento da assinatura das cártulas Conhecimento inequívoco de que foram sacadas de forma irregular Autoria comprovada Condenação mantida. 

Duplicada simulada: Crime formal que se consuma com a colocação do título no mercado Ausência de prejuízo à vítima Irrelevância Condenação mantida; 

Duplicata simulada: Confissão Ausência de reconhecimento espontâneo e completo do delito Atenuante não caracterizada Aplicação, ademais, da Súmula nº 231, do Superior Tribunal de Justiça Recurso improvido.
 
Vistos.
 
Omissis, qualificado nos autos, foi denunciado, processado e ao final condenado por sentença prolatada pelo MM. Juiz de Direito Dr. Guaracy Sibille Leite, da 1ª Vara Criminal da Comarca de Ribeirão Preto, como incurso no art. 172, caput, do Código Penal, ao cumprimento da pena de 2 anos de reclusão em regime inicial aberto e 10 dias-multa, fixado em 1/10 do salário mínimo, substituída a privativa de liberdade por prestação pecuniária, no valor de 01 salário mínimo em benefício do Hospital do Câncer de Ribeirão Preto e entrega de cinco cestas básicas a entidade assistencial (fls. 128/132). 
 
Isto porque, em data e horários incertos do ano de 2006, agindo em concurso com Carlos Eduardo Fernandes, na qualidade de representante da empresa “Comercial Mazzei Ltda.”, concorreu para a emissão de duplicatas sacadas em nome de Omissis  que não correspondiam a venda mercantil ou a serviços regularmente prestados. 
 
Inconformada recorre a Defesa alegando, em síntese, que não restou comprovado o dolo, bem como o prejuízo suportado pela vítima, devendo o réu ser absolvido. Alternativamente, pleiteia a aplicação da atenuante da confissão espontânea (fls. 136/150). 
 
Recebido o recurso (fls. 152), vieram aos autos as contrarrazões (fls. 154/156). 
 
Bem processado o apelo, a d. Procuradoria Geral de Justiça manifesta-se, em preliminar, pelo reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva e, no mérito, pelo improvimento do recurso (fls. 162/165). 
 
Anote-se que o processo foi inicialmente distribuído para a Col. 13ª Câmara de Direito Criminal (fls. 161), mas acabou redistribuído para essa E. 4ª Câmara Criminal Extraordinária (fls. 168). 
 
É o relatório. 
 
Cuida-se de recurso interposto por Omissis contra a r. sentença de fls. 128/132 que julgou procedente a ação penal e o condenou, por infringência ao art. 172, caput, do Código Penal, ao cumprimento da pena de 2 anos de reclusão em regime inicial aberto e 10 dias-multa, fixado em 1/10 do salário mínimo, substituída a privativa de liberdade por prestação pecuniária, no valor de 01 salário mínimo, em benefício do Hospital do Câncer de Ribeirão Preto e entrega de cinco cestas básicas a entidade assistencial. 
 
E, na análise das razões de recurso, cumpre inicialmente rejeitar a preliminar de prescrição levantada pela d. Procuradoria Geral de Justiça. 
 
Isso porque, o acusado foi condenado ao cumprimento da pena de 2 anos de detenção, que, nos termos do art. 109, inciso V, do Código Penal, tem prazo prescricional de 4 anos. 
 
Assim, entre a data do recebimento da denúncia aqui considerado o prazo em que o processo permaneceu suspenso condicionalmente, quando a prescrição fica igualmente suspensa e a da publicação da sentença, não se passaram mais de quatro anos. 
 
Nem se diga que o acusado é maior de 70 anos de idade, o que justificaria a redução pela metade do prazo prescricional (art. 115 do Código Penal), pois nos termos do citado dispositivo, essa condição deve ser aferida por ocasião da sentença, sendo irrelevante que, depois, o agente complete a idade necessária. 
 
Por aqui, de acordo com a identificação criminal de fls. 27, o apelante nasceu em 22/06/1941, e como a sentença condenatória foi publicada em 18/06/2010, ele contava com 69 anos de idade, razão pela qual não incide a regra do art. 115 do Código Penal a ponto de fazer reduzir pela metade o prazo prescricional. 
 
É certo, repita-se, que o réu já atingiu os 70 anos de idade, mas segundo o entendimento doutrinário e jurisprudencial, nessa hipótese não incide a regra. 
 
Conforme ensina Guilherme de Souza Nucci, “... A lei é clara ao instituir o benefício do cômputo, pela metade, do período prescricional ao maior de 70 anos, na data da sentença. Por isso, pouco interessa a idade que possua no momento em que houver julgamento de recurso seu, proferindo-se um acórdão.” (Código Penal Comentado, Editora Revista dos Tribunais, 13ª edição, pág. 614). 
 
Desse posicionamento não se afasta o Col. Supremo Tribunal Federal: “I O lapso prescricional somente é reduzido à metade quando o agente conta com 70 (setenta) anos de idade na data da sentença condenatória. II Hipótese dos autos em que o agente apenas completou idade necessária à redução do prazo prescricional quando estava pendente de julgamento agravo de instrumento interposto de decisão que inadmitiu recurso extraordinário.”(Ag. Reg. no Agravo de Instrumento 624.599-1, S. Paulo, 1ª Turma, rel. Ministro Ricardo Lewandowski, julgado em 19/06/2007, v.u.). 
 
Portanto, como se viu, não há falar em prescrição, razão pela qual fica rejeitada a preliminar trazida no parecer da Procuradoria de Justiça. 
 
No mérito, forçoso concluir que a absolvição pretendida era mesmo impossível. 
 
Não se discute a materialidade do delito, bem comprovada pelos documentos de fls. 44/45, onde a emissão das duplicatas sacadas contra José Alves de Lima e descontadas no banco “Nossa Caixa” estão bem evidenciadas. 
 
A autoria, por seu turno, acabou até mesmo admitida pelo apelante, que, ao ser interrogado na delegacia, relatou que passou por problemas de saúde e ficou afastado da empresa, razão pela qual seus funcionários nesse período emitiram duplicatas para endereços diferentes daqueles constantes no cadastro de clientes. Além disso, Roberto confirmou que os títulos foram posteriormente negociados com o Banco Nossa Caixa (fls. 8). 
 
Em juízo, agora sob as garantias do contraditório, o recorrente voltou a confirmar a emissão ilegal das duplicatas, procurando justificar a conduta com o argumento de que estava enfermo e seu funcionário, na ânsia de ajudar, acabou emitindo os títulos que não correspondiam a qualquer tipo de negócio ou prestação de serviços. Disse mais, que durante o período em que esteve afastado assinou diversos títulos e mandou para a firma, reconhecendo que o “...errado fui eu” (fls. 117/120). 
 
Ora, nenhum comerciante, que assina duplicatas em branco, pode alegar que desconhecia a irregularidade dos títulos indevidamente emitidos, já que contribuiu para colocar em circulação título que não correspondia a negócio subjacente. 
 
A duplicata, como se sabe, é título causal e sua emissão deve estar vinculada a uma venda mercantil ou prestação de serviços, sem o que torna-se evidente a ilicitude da conduta daquele que põe em circulação documento que não corresponde a negócio regularmente realizado. 
 
Nesse sentido, “...é um título de crédito formal, circulante por meio de endosso, constituindo um saque fundado sobre crédito proveniente de contrato de compra e venda mercantil ou de prestação de serviços, assimilado aos títulos cambiários por força de lei.” (Curso de Direito Comercial, Rubens Requião, vol. 2, Editora Saraiva, 2006, pág. 561). 
 
Bem por isso, impossível alegar falta de dolo na conduta do comerciante que, mesmo sendo o responsável pelo preenchimento do título, assina em branco os formulários, pois é evidente que ao agir dessa forma tem plena consciência de que a duplicata vai ser colocada em circulação sem que corresponda a negócio subjacente. Vale dizer, aderiu conscientemente à conduta de seus funcionários, na medida em que reconheceu que nunca forneceu serviços ou produtos ao sacado. 
 
De qualquer forma, o ofendido, em declarações semelhantes àquelas prestadas no inquérito, voltou a afirmar que nunca negociou com o réu, que, na verdade, é seu cunhado, mas mesmo assim foram emitidas e protestadas quatro duplicatas em seu nome (fls. 106). 
 
Dessa forma, na medida em que, mesmo hospitalizado, o acusado continuou a ser o responsável pelas transações da empresa e, consequentemente, pela transferência e emissões de títulos de crédito; e, já que nenhuma prova de sua inocência foi produzida nos autos, a condenação era mesmo a solução que se impunha. 
 
Tampouco é caso de absolvição pela falta de prejuízo para a vítima, uma vez que os títulos ilícitos foram descontados junto a uma instituição financeira e, com isso, o apelante, mediante utilização de artifício fraudulento, obteve vantagem econômica indevida. 
 
De mais a mais, o crime de duplicata simulada é considerado formal e se consuma no momento em que o título é colocado em circulação, sendo irrelevante, a partir daí, qual o resultado decorrente da conduta, pois o prejuízo deve ser visto como exaurimento da conduta. 
 
Nesse sentido: “O crime de duplicada simulada é de índole formal, de sorte que para a consumação não se exige um prejuízo efetivo a quem quer que seja. Basta que o título seja colocado em circulação, na qual está inserida a potencialidade de dano à segurança dos negócios” (TJSP, RT 695/305, in Código Penal e sua Interpretação Jurisprudencial, Alberto Silva Franco e outros, 5ª Edição, pag. 2253). 
 
Bem por isso, indiscutível o acerto do decreto condenatório. 
 
A pena foi dosada com critério, compensados os maus antecedentes com a idade do acusado, e estabelecida no mínimo legal, em 2 anos de detenção (embora a sentença tenha feito indevida referência a reclusão) e 10 dias multa, fixado em 1/10 do salário mínimo, em face da condição econômica do réu. 
 
Observe-se, outrossim, que não era mesmo o caso de reconhecimento da atenuante da confissão espontânea, uma vez que o apelante não admitiu plenamente a autoria do crime, circunstância que não revela absoluta sinceridade e intenção de colaborar com o esclarecimento dos fatos. 
 
E, ainda que reconhecida a atenuante, por força da Súmula nº 231 do Col. Superior Tribunal de Justiça, sua aplicação não teria consequências, porque a reprimenda já foi fixada no mínimo. 
 
Finalmente, a pena privativa de liberdade foi substituída por restritiva de direitos, de nada mais podendo reclamar a combativa Defesa. 
 
Diante do exposto, rejeitada a preliminar, NEGA-SE PROVIMENTO AO RECURSO para manutenção da r. sentença proferida pelos seus próprios fundamentos. 
 
Custas na forma da lei. 
 
ALEXANDRE Carvalho e Silva de ALMEIDA 
RELATOR