TJSP - FACTORING - CONFISSÃO DE DÍVIDA COM NOTAS PROMISSÓRIAS - EXECUÇÃO INDEPENDE DA PROVA DO CRÉDITO

EXECUÇÃO POR QUANTIA CERTA. Título executivo extrajudicial. Credores cessionários de escritura pública de confissão de dívida e notas promissórias, com garantia hipotecária. 1. Cerceamento de defesa.Inocorrência. Não é a simples alegação (muito menos a vazia de conteúdo), que autoriza a prova, mas sim a alegação de fato jurídico, que é um acontecimento da vida (certo, definido, preciso) do qual decorrem consequências jurídicas. 2. Ausência de fundamentação na r. sentença apelada. Inocorrência. “A função judicial é prática, só lhe importando as teses discutidas no processo enquanto necessárias ao julgamento da causa”. 3. Presunção de liquidez, certeza e exigibilidade não desmerecida por prova em contrário. Inversão do ônus da prova quanto a tais requisitos. Inadmissibilidade. A execução decorrente do título, judicial ou extrajudicial, não fica condicionada nem à existência nem à prova do crédito. 4. Alegada dependência econômica para com os credores originais do título cedido que repercutiria na prática de juros usurários. Confusão patrimonial e venda de cheques e duplicatas indicando presença de faturização. Ausência de provas ou mesmo indícios sérios de que o valor cobrado incluiria apenas juros abusivos. 5. Crédito constituído em escritura pública com garantia hipotecária. Cessão por instrumento particular. Fato que conquanto possa afastar o direito a garantia hipotecária dos cessionários, não ameniza a responsabilidade patrimonial dos embargantes devedores (CPC, art. 591). Constrição já levada a efeito sobre o imóvel que garante a dívida. Manutenção, porém, por conta da responsabilidade patrimonial dos devedores. 6. Alegação de excesso de execução por não consideração dos pagamentos parciais. Inocorrência. Cálculo exequendo que encontra o quantum debeatur já descontados as parcelas pagas pelos executados. Embargos do devedor rejeitados. Recurso não provido.
PODER JUDICIÁRIO
 
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
 
Registro: 2013.0000557351
 
ACÓRDÃO
 
Vistos, relatados e discutidos estes autos do Apelação nº 0017620-27.2011.8.26.0006, da Comarca de São Paulo, em que são apelantes MILTON JOAQUIM e NAIR MOSSO JOAQUIM, são apelados JOSE CARLOS CORROCHANO e MARCELI DOS SANTOS CORROCHANO.
 
ACORDAM, em 11ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento ao recurso. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.
 
O julgamento teve a participação dos Exmos.
 
Desembargadores GILBERTO DOS SANTOS (Presidente), WALTER FONSECA E GIL COELHO.
 
São Paulo, 12 de setembro de 2013.
 
GILBERTO DOS SANTOS
 
RELATOR
 

11ª Câmara de Direito Privado
 
Apelação n.º 0017620-27.2011.8.26.0006 - Comarca de São Paulo - Voto nº 24702
 
Voto nº 24.702
 
Apelação n.º 0017620-27.2011.8.26.0006
 
Comarca: São Paulo - 4ª Vara Cível
 
Apelantes: Milton Joaquim e Nair Mosso Joaquim
 
Apelados: Jose Carlos Corrochano e Marceli dos Santos Corrochano
 
Juiz(a) de 1ª Inst.: Rosangela Maria Telles
 
EXECUÇÃO POR QUANTIA CERTA. Título executivo extrajudicial. Credores cessionários de escritura pública de confissão de dívida e notas promissórias, com garantia hipotecária. 1. Cerceamento de defesa.Inocorrência. Não é a simples alegação (muito menos a vazia de conteúdo), que autoriza a prova, mas sim a alegação de fato jurídico, que é um acontecimento da vida (certo, definido, preciso) do qual decorrem consequências jurídicas. 2. Ausência de fundamentação na r. sentença apelada. Inocorrência. “A função judicial é prática, só lhe importando as teses discutidas no processo enquanto necessárias ao julgamento da causa”. 3. Presunção de liquidez, certeza e exigibilidade não desmerecida por prova em contrário. Inversão do ônus da prova quanto a tais requisitos. Inadmissibilidade. A execução decorrente do título, judicial ou extrajudicial, não fica condicionada nem à existência nem à prova do crédito. 4. Alegada dependência econômica para com os credores originais do título cedido que repercutiria na prática de juros usurários. Confusão patrimonial e venda de cheques e duplicatas indicando presença de faturização. Ausência de provas ou mesmo indícios sérios de que o valor cobrado incluiria apenas juros abusivos. 5. Crédito constituído em escritura pública com garantia hipotecária. Cessão por instrumento particular. Fato que conquanto possa afastar o direito a garantia hipotecária dos cessionários, não ameniza a responsabilidade patrimonial dos embargantes devedores (CPC, art. 591). Constrição já levada a efeito sobre o imóvel que garante a dívida. Manutenção, porém, por conta da responsabilidade patrimonial dos devedores. 6. Alegação de excesso de execução por não consideração dos pagamentos parciais. Inocorrência. Cálculo exequendo que encontra o quantum debeatur já descontados as parcelas pagas pelos executados. Embargos do devedor rejeitados. Recurso não provido.
 
Embargos a execução de cessão de crédito oriunda de confissão de dívida garantida por hipoteca no valor de R$ 342.826,11, foram rejeitados pela r. sentença de fls. 2970/2973, de relatório adotado, que condenou os embargantes no pagamento das custas, despesas processuais e honorários de advogado fixados em 15% sobre o valor da dívida. Embargos de declaração (fls. 2976/2986), não foram acolhidos (fls. 2987).
 
Apelam os executados (fls. 3008/3066) preliminarmente aduzindo: cerceamento de defesa por falta de realização de perícia contábil “com conciliação bancária, expedição de ofícios e a oitiva das testemunhas”; ofensa ao contraditório, à ampla defesa e ao devido processo legal; falta de fundamentação da r. sentença; carência de ação por falta de liquidez do título já que a dívida nele representada advém de encargos excessivos, cujo valor nele confessado é infinitamente superior ao devido, que só pode ser obtido com o refazimento dos cálculos. No mérito, defendem a possibilidade de se arguir contra o cessionário as exceções pessoais oponíveis ao credor originário, eis que as qualidades e os vícios do crédito cedido o acompanham; ilicitude do objeto da confissão de dívida por se originar da cobrança extorsiva de juros; extinção da garantia real sobre imóvel em razão da cessão dessa garantia ter sido feita por instrumento particular, nos termos do art. 108 do Código Civil; necessidade de observância da inversão do ônus da prova por força da MP. Nº 2.172-32/01; impossibilidade do instrumento que é nulo se convalidar, pois quando o objeto da transação for ilício (tal qual agiotagem), o negócio jurídico é nulo; não há se falar que a dívida que era nula foi “novada”, pois a dívida com esse vício não pode ser objeto de novação; do valor das operações de empréstimo de dinheiro devem ser descontados os valores que já foram pagos pelos apelantes (R$ 145.808,00), com atualização e juros. 
 
De resto, pugnam pelo provimento do recurso para anulação da r. sentença, ou, de outro modo, para a reforma total do julgado, com acolhimento das razões dos embargos a execução. 
 
Recurso preparado (fls. 3067/3069) e respondido pelos credores (fls. 3290/3297) que postularam a manutenção da sentença guerreada, até porque o título exequendo não possui qualquer vício de forma ou consentimento e está revestido de certeza, liquidez e exigibilidade.
 
É o relatório.
 
De início, não vingam as preliminares dos embargantes.
 
Ao contrário do que afirmam a motivação/fundamentação expendida foi mais do que suficiente, pois a MMa. Juíza a quo analisou todas as questões relevantes, albergando teses condizentes com a linha principal de raciocínio e a solução adotada.
 
Conforme já se decidiu: “A função judicial é prática, só lhe importando as teses discutidas no processo enquanto necessárias ao julgamento da causa. Nessa linha, o juiz não precisa, ao julgar procedente a ação, examinar-lhe todos os fundamentos. Se um deles é suficiente para esse resultado, não está obrigado ao exame dos demais” (STJ-2ª Turma, REsp 15.450-SP-EDcl, Rel. Min. ARI PARGENDLER, DJU 6.5.96, p. 14.399).
 
E ainda, a propósito e reportando-se a Julgado do Egrégio Superior Tribunal de Justiça (STJ, Ag. 35112-3, Rel. Min. FONTES DE ALENCAR), NELSON NERY JÚNIOR e ROSA MARIA ANDRADE NERY assinalam: “Não é nula a sentença quando o juiz, embora sem grande desenvolvimento, deu as especificações dos fatos e a razão de seu convencimento, havendo decidido dentro dos limites em que as partes reclamaram, sem a eiva dos vícios extra, ultra ou citra petita” (Código de Processo Civil Comentado, pág. 667, RT, 3ª ed.).
 
Na mesma esteira, não há se falar em cerceamento de defesa.
 
O cerceamento se dá quando prova relevante é indevidamente dispensada, mas isso não se deu no caso, pois os elementos trazidos aos autos já davam subsídios suficientes para formação de convencimento seguro sobre o direito invocado pelos embargantes.
 
A carência da ação por falta de liquidez do título, de sua vez, constitui matéria pretenciosa para preliminar, mormente por estar lastreada a presente execução em escritura pública de confissão de dívida parcelada em 60 vezes.
 
Enfim, também são virtuais as alegadas ofensas ao contraditório, ampla defesa e devido processo legal.
 
Todo o necessário para o deslinde da causa foi considerado e nem mesmo a dispensa de produção de provas para se chegar à conclusão foi resultante de qualquer descaso com os institutos acima mencionado, como se verá adiante.
 
No mérito, em que pesem suas alentadas razões, o recurso não há de prosperar.
 
A execução por quantia certa veio lastreada em Instrumento Particular de Cessão e Transferência de Crédito com Garantia Hipotecária (fls. 3078/3081) mediante o qual os credores se sub-rogaram nos direitos de escritura pública de confissão de dívida com garantia hipotecária (fls. 3082/3082vº) acompanhada de 60 sessenta notas promissórias, totalizando R$ 479.980,00, dos quais estavam em aberto na época de sua propositura o valor de R$ 342.826,11, correspondente às parcelas de 22 em diante (fls. 3070/3076).
 
Em seus embargos os devedores sustentaram a ausência de liquidez, certeza e exigibilidade dos títulos, dizendo que a dívida neles retratada teria “origem ilícita”, porque proveniente de conduta usurária dos mutuantes originais Miguel Rodrigues, casado com Vania Nunes de Almeida Rodrigues (fls. 3082), em face dos apelantes que viviam “desesperadora situação financeira”.
 
Afirmaram também que os empréstimos vinham pelas empresas Paulista Coml. e Cobranças Ltda, bem como de Metrópole Coml Cobranças Ltda., ambas gerenciadas pelo casal de mutuantes originários, e sempre em socorro dos pagamentos de urgência que envolviam contas pessoais dos embargantes, de seus familiares e da empresa da família, Namil Indústria e Comércio de Artefatos de Espuma Ltda.
 
E agora, somente depois de 11 anos supostamente tomando os recursos emprestados dos credores originais, mesmo assim, depois de serem executados pela dívida que confessaram, decidiram revolver o passado em prol de lograr encontrar excesso na cobrança de juros.
 
Contudo, sem razão.
 
Fácil perceber que aqui os embargantes elegem a perícia técnica contábil como uma espécie de panaceia para resolver todo um pernicioso modus operandi pelo qual eles mesmos adotaram cronicamente há mais de uma década!
 
Dentre as miríades de providências que pedem como imprescindíveis à prova do direito que julgam ter, estão: a) apuração de valores emprestados aos apelantes ou indiretamente aos seus familiares; b) valores efetivamente pagos pelos apelantes e por sua família aos credores Miguel e Vânia Rodrigues; c) apuração do verdadeiro saldo em aberto limitando-se os encargos de cada parcela de empréstimo àqueles autorizados por lei; d) expedição de ofícios aos Banco Bradesco, Itaú, Safra e BCN “para que forneçam extratos completos e detalhados das contas dos apelantes, desde 1997, quando iniciaram as operações de mútuo com Sr. Miguel Rodrigues e sua esposa”, bem como do filho destes, Michel Henrique Nunes Rodrigues; e) ofício ao Banco Central do Brasil para que informasse “todas as contas bancárias” em nome de Miguel Rodrigues, Vania Nunes e Michel Henrique, além das contas das empresas de cobrança Paulista e Metrópole; f) ofícios as agências especificadas do Banco do Brasil S/A, Banco Itaú e Banco Bradesco, de titularidade das partes; g) prova pericial com “conciliação bancária”; h) oitiva de testemunhas que poderiam comprovar as transações efetuadas (vide fls. 3016/3020).
 
Contudo, independentemente da possibilidade dos devedores virem a arguir exceções de ordem pessoal relativas aos credores originais (CC, art. 294), pela própria natureza das provas requeridas, que ensejam mais a uma verdadeira devassa da vida econômica dos credores originais e devedores “indiretos” (pessoas jurídicas administradas pelos credores originais e familiares beneficiados com os empréstimos, os quais nem figuram neste processo para se defenderem), infere-se que sua linha probatória é nada delimitada e demasiadamente genérica e vaga.
 
Por primarem pouco pela objetividade, tendem a transformar o juízo num “investigador” a serviço da parte, com o encargo de apurar e corrigir alguma irregularidade eventualmente encontrada.
 
Isso, entretanto, não é possível porque é sabido que “o fato indeterminado, ou indefinido, é insuscetível de prova” (MOACYR AMARAL SANTOS, Comentários ao Código de Processo Civil, Forense, IV vol., pág. 35, 3ª ed.).
 
E se é insuscetível de prova, porque dela nada poderá frutificar, senão o puro aumento do custo processual e da demora na entrega da prestação jurisdicional, foi correta a sua dispensa nos termos do que expressamente permite o artigo 130 do CPC, com toda a observância do devido processo legal (CF, art. 5º, LIV).
 
Do volume 1º dos autos até praticamente metade do volume 14, num total de mais de 2600 (duas mil e seiscentas) folhas, os embargantes devedores encartam planilhas com relações de cheques e títulos (duplicatas) “aparentemente” descontadas com as empresas dos credores originais.
 
Aparentemente porque não se comprova “formalmente” qualquer tratativa entre as partes e que tais documentos teriam sido trocados entre elas.
 
E justamente nesses documentos, segundo os credores, residiria a causa de sua ruína econômica. Lá, entendem os executados, é que foram praticados os descontos de 5% nos títulos, os quais singelamente denomina “juros”. Por isso querem a perícia contábil. Para comprovarem o caráter usurário e leonino dos credores que foram impiedosos consigo.
 
Mas, a pergunta que se faz é: para que fazer uma perícia, uma hecatombe nas contas correntes das partes e de terceiros que nem participam da relação processual? Para o perito comparar com o que? Com o que foi contratado?
 
O que foi contratado?
 
Ora, com o devido respeito, a perícia não se presta a “criar” direitos onde eles não existem. A perícia está para o processo tal qual o termômetro para o paciente: não provoca a febre, nem a cura; apenas descobre se o paciente a tem, nada mais.
 
Com efeito, tudo nos autos converge no sentido de que as partes mantiveram negócios de cessão de créditos, em operações de factoring. Os embargantes inclusive reconhecem que na época (época até grande, já que ultrapassa uma década !!) passavam por sérios problemas financeiros, que aliás foram só se agravando, e pelas restrições cadastrais junto aos Bancos não tinham como conseguir capital para movimentar a produção ou mesmo para pagarem “contas pessoais”.
 
Aqui, em verdade, ocorreu entre os embargantes e sua empresa familiar algo que o direito não vê com bons olhos e denomina de “confusão patrimonial” (CC, art. 50). Eles mesmos confessaram que a “solicitação de depósitos de valores em conta de integrantes da família era feita através dos faxes que eram trocados com os mutuantes” (fls. 3028)!
 
Por outra parte, a dívida executada vem fundada em cessão de direitos particular, porém, derivada de escritura pública de confissão de dívida, que, como documento público, “faz prova não só da sua formação, mas também dos fatos que o escrivão, o tabelião, ou o funcionário declarar que ocorreram em sua presença” (art. 364, CPC).
 
Nessa escritura os embargantes se confessaram devedores de R$ 479.980,00, que, pelas próprias narrativas dos autos correspondem a dívida proveniente de débitos anteriores com operações de factoring, portanto fazendo presumir verdadeira tal realidade fática.
 
A par disso, a execução vem também lastreada nas 60 notas promissórias emitidas pelos embargantes, que como títulos de crédito que são gozam de presunção de liquidez, certeza e exigibilidade.
 
Para destruir a força executiva provinda de tais títulos, impunha-se que os embargantes tivessem apresentado sólidos elementos de prova em contrário, o que infelizmente não conseguiram fazer.
 
Não cabia, como parece ter ocorrido, simplesmente transferir à exequente a obrigação de demonstrar a regularidade da dívida nos termos da MP Nº 2.172-32/01, porque isso, em princípio, já vinha estampado nos próprios títulos executivos.
 
Conforme é sabido, obrigação e título são coisas diversas, sendo que, como ensina SÉRGIO SHIMURA: “A lei processual separa o título da causa da obrigação, reconhecendo eficácia própria, abstraindo-a de seu fundamento.
 
Portanto, a força executiva emana do documento” (Título Executivo. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 112). Ou como mais precisamente diz o Jurista: “(...) a execução decorrente do título, judicial ou extrajudicial, não fica condicionada nem à existência nem à prova do crédito. Daí afirmar-se sua autonomia em relação ao
liame de natureza material” (Ob. Cit., p. 113).
 
Em outras palavras, dispondo de título executivo hábil, como também observou a MMa. Juíza prolatora da r. sentença, os exequentes não têm mais o que provar além ou fora do título, pois ao devedor-embargante é que cumpre apresentar defesa e provas capazes de desconstituir a força executiva de que o título ajuizado desfruta por vontade da lei.
 
Bem por isso, como ensina HUMBERTO THEODORO JR.: “Não são os embargos uma simples resistência passiva como é a contestação no processo de conhecimento. Só aparentemente podem ser tidos como resposta do devedor ao pedido do credor. Na verdade, o embargante toma uma posição ativa ou de ataque, exercitando contra o credor o direito de ação à procura de uma sentença que possa extinguir o processo ou desconstituir a eficácia do título executivo” (Curso de Direito Processual Civil. Vol. II. 41ª ed. Rio de Janeiro:Forense, 2007, p. 429).
 
No caso em exame, conquanto os embargantes tivessem alegado que o montante devido não seria aquele exigido, nenhuma prova efetiva apresentaram para respaldo disso.
 
As próprias alegações dos embargos foram algo desconexas, na medida em que não indicam com exatidão qual seria a dívida que deveria ser considerada. E isso não deveria ser difícil de se demonstrar, como alegam. Afinal, se efetuaram os descontos de títulos certamente deveriam saber (com base em sua contabilidade) quais teriam sido, suas datas e valores etc.
 
Ao contrário, como preferiram durante anos a resolução de seus problemas financeiros pela facilidade da “informalidade”, não podem, a pretexto de minimizá-los, quererem opor contra um título extrajudicial a mesma “informalidade” de que se valeram durante mais de uma década.
 
Tocante a alegada “agiotagem” sequer foi evidenciada nos autos, pois nada nada mesmo indica a cobrança de juros, muito menos acima da taxa legal, portanto inexistindo verossimilhança capaz de autorizar a via excepcional da inversão do ônus da prova.
 
A propósito, nas operações de factoring nem cabe falar propriamente em juros, porque a remuneração do faturizador é constituída pelo fator, que “é o deságio (diferencial ou comissão) entre o valor de face do título cedido e o pagamento feito pela empresa de factoring” (ANTONIO CARLOS DONINI. Facoring. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 21).
 
O fator portanto é algo mais amplo, englobando uma série de custos de oportunidade e dos financiamentos, entre os quais também há juros, mas não só estes.
 
Logo, no mínimo temerário dizer que, no caso, “somente uma perícia direta nas contas pessoais dos credores originários e das empresas de cobrança mencionadas, em conjunto com as contas pessoais dos apelantes e da empresa NAMIL, promovendo-se detalhada conciliação bancária mediante quebra de sigilo” (fls. 3030/3031), poderia comprovar a “agiotagem”.
 
Em consequência disso, falacioso dizer simplesmente que a confecção da escritura pública de confissão de dívida seria nula por ser mera “novação” de um negócio jurídico subjacente ilícito.
 
Pelo que se vê, a lavratura da escritura pública fora apenas a derradeira tratativa para compor acerto de dívidas oriundas da rotineira venda de títulos dos devedores aos mutuantes originários. A ilicitude, de tais operações, entretanto, não fora nem indiciariamente demonstrada nos autos, de modo que não há se falar em escritura pública decorrente de transações desprovidas de legalidade.
 
Finalmente, não é possível reconhecer o alegado “excesso de execução”, porquanto os elementos dos autos não convencem sobre a falta de desconto dos pagamentos parciais totalizando R$ 145.808,00 (fls. 3050).
 
De fato, os embargantes fazem (ou tentam fazer) prova dos pagamentos parciais da dívida com os documentos de fls. 2667/2722.
 
Ali, com alguma dificuldade, conseguem demonstrar terem pagado até a prestação 21/60, muito embora com pagamentos de parcelas fracionados em números diferentes daqueles combinados (vide, p.ex., depósitos de fls. 2712, 2713, 2714, 2715, 2717 e transferência de fls. 2718).
 
Contudo, ao cuidar da atualização das parcelas vencidas e não pagas até o ajuizamento da ação, os credores não colocaram nos cálculos quaisquer das parcelas que se encontravam demonstradas como adimplidas pelos devedores a fls. 2667/2722.
 
De acordo com os cálculos que municiaram a petição inicial da execução, as prestações devidas até esse ajuizamento partem da parcela de nº 22/60, logo, não invadindo o rol daquelas que os embargantes reputam saldadas.
 
Ademais, até mesmo a parcela 21/60, paga "fracionadamente" em 21.05.2010 (fls. 2740), com um atraso de praticamente meio ano e em valores históricos, fora devidamente descontada nos cálculos exequendos, conforme demonstrado a fls. 2748.
 
Quanto a necessidade de ser por escritura pública (e de preferência levada a registro) a aludida cessão de direitos creditórios, brilhantemente acertada a colocação nos embargos, de conformidade com o art. 108 do Código Civil.
 
Mas a tese não socorre aos devedores e nem desmerece a penhora já levada a efeito na presente execução (fls. 3173).
 
É que, a par do direito material invocado nos autos, também existe uma regra, segundo a qual os devedores respondem para o cumprimento de suas obrigações com “todos” os seus bens presentes e futuros (CPC, art. 591).
 
Nessas condições, se por acaso o mesmo imóvel dado em garantia hipotecária, sito na Rua Francesco Melzi, lote 38, da quadra 14 do Jd. Ipanema Vila Matilde, encontra-se dentro do patrimônio dos devedores, referido bem pode e deve responder pela obrigação por eles assumida.
 
Daí, ainda que não se fale em direito à garantia hipotecária dos atuais credores cessionários, impossível afastar a ideia de responsabilidade patrimonial que pesa sobre os devedores. Aludida responsabilidade, a propósito, só poderia ser amenizada pela alegação de restrições estabelecidas em lei (CPC, art. 591, parte final). Como tais alegações não se fizeram nos autos, a manutenção da constrição é medida de rigor.
 
Ante o exposto e pelo mais que dos autos consta, nego provimento ao recurso.
 
GILBERTO DOS SANTOS
Desembargador Relator